guimarães rosa - Academia Mineira de Letras
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222 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />
lindos para morar, carro com placa CD autorizando estacionar on<strong>de</strong> quiser,<br />
tempo para ler e escrever longas cartas, ou melhor, e-mails, chofer particular e,<br />
acima <strong>de</strong> tudo, muito glamour à noite, regado a bons vinhos e nenhum trabalho<br />
burocrático, político ou comercial. Tudo, é claro, com muita elegância <strong>de</strong>ntro<br />
do circuito Londres, Paris e New York. Alguns abençoados do Itamaraty<br />
trabalham e recebem essas benesses, mas é importante lembrar que o Brasil tem<br />
várias embaixadas em lugares on<strong>de</strong> o tédio passa férias e o diabo tem<br />
residência fixa. E vários diplomatas estão lá neste momento, <strong>de</strong>smentindo<br />
aquele imaginário.<br />
Por certo, as duas estrela-guias <strong>de</strong> Sergio Telles serviram <strong>de</strong> bússola<br />
orientadora e ele brilhou no Rio <strong>de</strong> Janeiro e em locais tão encantadores e<br />
privilegiados, que se pôs a pintá-los. E aquelas luzes celestiais, acessas quando<br />
ele nasceu, foram se intensificando pela sua vida afora e ele, generoso, as<br />
transferiu para suas telas. Daí a beleza <strong>de</strong> suas telas. Mas que ninguém imagine<br />
ser essa ativida<strong>de</strong> um lazer na época da vida na qual po<strong>de</strong>mos nos dar ao luxo<br />
<strong>de</strong> ócio com dignida<strong>de</strong>. Sua trajetória <strong>de</strong> artista é tão anterior àquela <strong>de</strong><br />
diplomata que, aos <strong>de</strong>zoito anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, era contemplado com o Prêmio <strong>de</strong><br />
Viagem ao País pela Escola <strong>de</strong> Belas Artes do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Ser premiado<br />
com essa ida<strong>de</strong>, por certo, é o resultado <strong>de</strong> garra, <strong>de</strong>terminação. Por isso, se ele<br />
não tivesse seguido carrière e pelo talento <strong>de</strong> que é possuidor, continuaria<br />
sendo quem é há muito: um artista <strong>de</strong> primeira linha, que não ce<strong>de</strong> a modismos<br />
pós-mo<strong>de</strong>rnos, elaborando a arte do <strong>de</strong>senho, aquarela e pintura como ele<br />
acredita, conhece e sabe.<br />
O espectador <strong>de</strong>spreparado po<strong>de</strong> se surpreen<strong>de</strong>r com a simplicida<strong>de</strong><br />
enganosa, própria <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s artistas, e imaginar que o que está na tela é<br />
ativida<strong>de</strong> fácil: bastam algumas pinceladas bem marcadas e cheias <strong>de</strong> cores na<br />
tela. Ser simples é ativida<strong>de</strong> que requer árduo exercício intelectual e é privilégio<br />
<strong>de</strong> poucos. Matisse, em célebre carta <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1948 e dirigida<br />
a Henry Clifford, diretor do Museu <strong>de</strong> Arte da Filadélfia, <strong>de</strong>monstrou toda<br />
preocupação que a sua monumental retrospectiva po<strong>de</strong>ria causar nos jovens<br />
artistas que viriam seus trabalhos e os imaginariam simples <strong>de</strong>mais, sem<br />
calcularem o custo emocional <strong>de</strong>les. Dizia Matisse: Como interpretarão eles a<br />
impressão <strong>de</strong> aparente facilida<strong>de</strong> que lhes produzirá uma visão geral e rápida<br />
e até mesmo superficial, <strong>de</strong> minhas pinturas e <strong>de</strong>senhos? Havia então na<br />
pergunta do mestre francês e há hoje entre o gran<strong>de</strong> público, o risco <strong>de</strong><br />
imaginar o resultado com simplicida<strong>de</strong> como algo <strong>de</strong> fácil feitura. Com os<br />
trabalhos <strong>de</strong> Manet, Monet, Duffy, Cézanne e dos nossos Guignard, Ianelli,<br />
Marcier, Vicente do Rego, Gomi<strong>de</strong>, Sergio Telles e outros privilegiados