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guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

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166 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />

Belo Horizonte é quem lhe dá o primeiro movimento – é lá que “sangue<br />

e <strong>de</strong>stino” são transformados em rubis imaginários. A virtualida<strong>de</strong> do sonho<br />

que pretextava construções <strong>de</strong> cristal acaba por produzir castelos <strong>de</strong><br />

apartamentos em concreto. A cida<strong>de</strong> foi construída por “engenheiros<br />

velhinhos” (o que é quase adynata) e através <strong>de</strong>les o poeta integra sua<br />

experiência pessoal – o retrato <strong>de</strong> Afonso Pena no selo postal, lembrança<br />

familiar da emigração. A partir <strong>de</strong> Belo Horizonte o poeta revive a experiência<br />

<strong>de</strong> outrora, como “urubu estampado / Nos calvários <strong>de</strong> Ouro Preto.” A aventura<br />

que constrói o futuro é semeada <strong>de</strong> “cobiça e perjúrio”, como na experiência<br />

daquele Fernão Dias que enforcou o filho na fazenda do Sumidouro, ali mesmo,<br />

a poucos quilômetros do centro <strong>de</strong> Belo Horizonte, pelo crime maior <strong>de</strong> não<br />

acreditar no sonho do pai. Tudo é memória, como o faiscar da tar<strong>de</strong> nas<br />

vidraças <strong>de</strong>sta Babel <strong>de</strong> lumes. Memória encerrada, como em espelho, naquele<br />

cemitério <strong>de</strong> negros <strong>de</strong> Santa Efigênia, entre flores e palavras que transitam do<br />

passado para o futuro. Ali, o túmulo do menino Elci lembra ao peregrino, na<br />

contradição que representa a morte <strong>de</strong> uma criança, a própria contradição da<br />

experiência humana, em busca <strong>de</strong> uma paz ao longe e que, existindo perto, não<br />

chega a ser “merecida” pelo que a busca. A eternida<strong>de</strong> a que aspira a<br />

transitorieda<strong>de</strong> do ser humano é o sono daquela criança. Nemésio se enamora<br />

mais daquela paisagem costeira, on<strong>de</strong> a presença portuguesa aflora no meio do<br />

exotismo <strong>de</strong> raças e ambientes diferentes. Português <strong>de</strong> sete partidas, sua<br />

emoção cristaliza esta simbiose do exótico e do natural, da mestiçagem já<br />

i<strong>de</strong>ntificável em seus valores próprios, expressas na visão poética e concreta<br />

que tem <strong>de</strong>stes ambientes e <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong> erotização mental que o leva a<br />

poetizar quase exclusivamente o Brasil baiano e carioca. Minas Gerais é outra<br />

coisa – ancestralida<strong>de</strong> lusitana, História com a qual convive e que procura<br />

enten<strong>de</strong>r e explicar mas que percebe muito mais intelectualmente como<br />

memória do que como “sentir do próprio tempo”. Ao exotismo do português já<br />

transformado em algo novo que se vê na costa – “Lá no varejo da Rampa /<br />

Aquele moleque sou eu” – Minas contrapõe o “segredo” da permanência, a<br />

linha <strong>de</strong> “sangue e <strong>de</strong>stino” que continua a fluir sempre nas velhas cida<strong>de</strong>s<br />

coloniais – “Ouro Preto... foco <strong>de</strong> oci<strong>de</strong>ntalida<strong>de</strong>” – e que são a fonte do<br />

milagre vital que é o momento mesmo da criação do novo – “Ó céu <strong>de</strong> Belo<br />

Horizonte, / Que futuro me daria / Teu movimento secreto?”<br />

Ao jovem estudante que, em 1952, numa sala universitária no centro <strong>de</strong><br />

uma cida<strong>de</strong> que era ponta <strong>de</strong> lança da expansão <strong>de</strong> uma cultura a que pertencia<br />

por “sangue e <strong>de</strong>stino”, sentava-se pela primeira vez para ouvir a voz exemplar<br />

<strong>de</strong> um escritor importante, Vitorino Nemésio dava uma lição <strong>de</strong> mistério – o

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