guimarães rosa - Academia Mineira de Letras
guimarães rosa - Academia Mineira de Letras
guimarães rosa - Academia Mineira de Letras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Permanência <strong>de</strong> Cecília ________________________________________________________ Pe. Paschoal Rangel 147<br />
Fascinado por esse Ser misterioso, “ele aceita seu ofício <strong>de</strong> poeta aos pés<br />
<strong>de</strong> Deus e a serviço dos homens” – escreve Cecília Meireles. E canta:<br />
Vida <strong>de</strong> minha vida, tratarei <strong>de</strong> trazer sempre puro o meu corpo,<br />
sabendo que o teu tato pousa sobre todos os meus membros. / Tratarei <strong>de</strong><br />
trazer sempre longe <strong>de</strong> meus pensamentos qualquer falsida<strong>de</strong>, sabendo que és<br />
tu essa verda<strong>de</strong> que acen<strong>de</strong> a luz da razão no meu espírito.”<br />
Talvez tenha pesado (“meu peso é leve”, disse um dia Jesus) sobre ele o<br />
exemplo <strong>de</strong> ascetismo e <strong>de</strong> mística <strong>de</strong> seu pai, “o Santo”. Ele pedia<br />
instantemente: “Fere, fere no meu coração a raiz da miséria” E “ele, o poeta,<br />
que canta, percebe estar cantando as canções do seu Senhor” (Cecília<br />
Meireles.) Mas Tagore não é um <strong>de</strong>sprezador do mundo, da natureza, que é<br />
obra do Criador. Ele é “um amoroso da vida, um amoroso <strong>de</strong> Deus”. Por isso,<br />
alegria ou tristeza não o atingem no que ele tem <strong>de</strong> mais profundo. Ele talvez<br />
dissesse como Cecília: “Não sou alegre nem sou triste, / sou poeta.”<br />
Acho que esses poucos dados poético-biográficos <strong>de</strong> Rabindranath<br />
Tagore, sorvidos em textos <strong>de</strong> Cecília Meireles, nos ajudarão a ler a “Cançãozinha<br />
para Tagore” que transcrevemos há pouco.<br />
Cecília Meireles e Tagore (3)<br />
Pensando no que Cecília Meireles nos disse <strong>de</strong> Rabindranath Tagore;<br />
pensando sobretudo no jeito com que ela fala <strong>de</strong>le, tal como acabamos <strong>de</strong> ver,<br />
enten<strong>de</strong>remos melhor a “Cançãozinha para Tagore”, que se encontra nos<br />
Poemas Escritos na Índia. (20)<br />
Tagore foi uma das gran<strong>de</strong>s paixões “místico-poéticas” na vida <strong>de</strong><br />
Cecília. Por tudo isso, quando um dia se encontrassem “àquele lado do tempo /<br />
on<strong>de</strong> abre a <strong>rosa</strong> da aurora”, chegariam <strong>de</strong> mãos dadas. Com a pureza das<br />
crianças, “cantando canções <strong>de</strong> roda”, e com a magia dos poetas, “com palavras<br />
encantadas”. Lá estarão do outro lado do tempo, “on<strong>de</strong> abre a <strong>rosa</strong> da aurora”,<br />
tempo e lugar das manhãs, um tempo sem tempo e um lugar mágico, <strong>de</strong> manhãs<br />
inespaciais, “para além <strong>de</strong> hoje e <strong>de</strong> outrora”, on<strong>de</strong> encontrarão os Reis ocultos<br />
(o encanto <strong>de</strong> “um céu e uma terra novos”), pelos quais os dois, um dia, foram<br />
(note-se no poema o verbo “fomos”) lágrimas e sauda<strong>de</strong>s.<br />
E o 1º e 2º versos da primeira estrofe se repetem – observe-se a anáfora,<br />
que retornará na 3ª e na 4ª estrofes, com o verso “chegaremos <strong>de</strong> mãos dadas”...<br />
A múltipla repetição, o entrelaçamento dos versos em estrofes diferentes vão