guimarães rosa - Academia Mineira de Letras
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88 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />
embrião, no volume inaugural <strong>de</strong> contos Sagarana. É evi<strong>de</strong>nte que os <strong>de</strong>z anos<br />
que me<strong>de</strong>iam entre a publicação das duas obras geram uma diferença nos<br />
recursos explorados, diferença se não qualitativa, pelo menos quantitativa. Nem<br />
po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong> outra forma, num autor tão escrupuloso e ao mesmo tempo tão<br />
ciente e consciente das virtualida<strong>de</strong>s da língua portuguesa quanto Guimarães<br />
Rosa.<br />
Em carta a João Condé, conta Guimarães Rosa que pensou muito, certo<br />
dia, quando chegou a hora <strong>de</strong> o Sagarana ser escrito. Depois <strong>de</strong> refletir sobre<br />
tudo que representava a palavra arte e <strong>de</strong> estabelecer algumas relações<br />
literárias, teve <strong>de</strong> escolher o terreno em que localizaria suas histórias. E acabou<br />
escolhendo o pedaço <strong>de</strong> Minas Gerais que era mais <strong>de</strong>le mesmo. Ouçamos as<br />
suas palavras:<br />
(...) E foi o que preferi. Porque tinha muitas sauda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> lá.<br />
Porque conhecia um pouco melhor a terra, a gente, bichos,<br />
árvores. Porque o povo do interior – sem convenções, “poses” –<br />
dá melhores personagens <strong>de</strong> parábolas: lá se vêem bem as<br />
reações humanas e a ação do <strong>de</strong>stino; lá se vê bem um rio cair na<br />
cachoeira ou contornar a montanha, e as gran<strong>de</strong>s árvores<br />
estalarem sob o raio, e cada talo do capim humano rebrotar com<br />
a chuva ou estorricar com a seca. (Carta a João Condé, in<br />
Sagarana, 64ª. Edição, 2006, p. 25).<br />
Continuando seu relato epistolar ao Amigo, assim Guimarães Rosa<br />
sintetiza a escolha da ambientação dos seus contos:<br />
(...) Bem, resumindo: ficou resolvido que o livro se passaria no<br />
interior <strong>de</strong> Minas Gerais. E compor-se-ia <strong>de</strong> 12 novelas. Aqui,<br />
meu caro Condé, findava a fase <strong>de</strong> premeditação. Restava agir.<br />
Então, passei horas <strong>de</strong> dias, fechado no quarto, cantando cantigas<br />
sertanejas, dialogando com vaqueiros <strong>de</strong> velha lembrança,<br />
“revendo” paisagens da minha terra, e aboiando para um gado<br />
imenso. (Ibi<strong>de</strong>m, p. 25)<br />
Passada essa fase <strong>de</strong> quase ruminação do livro, Guimarães Rosa começa<br />
a escrevê-lo. Na mesma carta, diz: lembro-me <strong>de</strong> que foi num domingo, <strong>de</strong><br />
manhã (p. 25). E conta ainda que o livro foi escrito em sete meses, quase todo<br />
na cama, a lápis, em ca<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> 100 folhas. (p. 25). Contratada uma