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guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

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114 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />

narrador inominado, ao contrário, é do tipo distraído, voltado para a beleza e os<br />

<strong>de</strong>talhes da paisagem. Desse modo, também <strong>de</strong> imediato, já temos por<br />

<strong>de</strong>lineada a sua pessoa, pouco afeita às preocupações do espírito e às canseiras<br />

do intelecto, um extrovertido bon vivant. Pois não?<br />

Ao apresentar o tio Emílio, entretanto, o extrovertido narrador, tão alheio<br />

aos aspectos estruturais da alma humana, parecia-me assim anteriormente, até<br />

que revela certo grau <strong>de</strong> senso <strong>de</strong> observador, expondo, com análise e proprieda<strong>de</strong><br />

crítica, as mudanças percebidas nos modos e ações do tio que o hospeda.<br />

Mas isso não nos convence <strong>de</strong> que ele costuma ir fundo na apreciação dos<br />

fatos, das coisas, das pessoas. O seu magno propósito é tão só visitar e valorizar<br />

as magnitu<strong>de</strong>s físicas. Tanto assim que, ao nos apresentar Maria Irma sua<br />

prima, esse mesmo narrador (para nós continua anônimo – nunca diz o seu<br />

nome) confirmará a primeira impressão que já <strong>de</strong> si nos <strong>de</strong>u – a <strong>de</strong> homem das<br />

exteriorida<strong>de</strong>s.<br />

Maria Irma, na linha <strong>de</strong> importância diegética, é a segunda personagem<br />

mais importante. Contracena com ele narrador, com quem forma o par amoroso<br />

da história central, que se <strong>de</strong>sdobrará como um jogo <strong>de</strong> interesses e traições.<br />

Para cumprir seu papel <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse xadrez amoroso, Maria Irma representa um<br />

tipo oposto ao temperamento e sentimentos do parceiro-narrador. Vale dizer:<br />

ela encarna a pessoa mentalmente ativa, preservando valores morais e intelectuais,<br />

po<strong>de</strong>ndo-se tê-la portanto como mulher liberada, culta e dominadora.<br />

Sabe o que quer e põe o que sente no que faz para ter o que <strong>de</strong>seja.<br />

Recor<strong>de</strong>-se como nos é apresentada:<br />

«Tio Emílio tem duas filhas. A mais velha, Helena, está casada e não<br />

mora aqui. A outra, Maria Irma, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser bastante bonita. Em outros<br />

tempos, fomos namorados. Desta vez me recebeu com ar <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança. Mas<br />

é alarmantemente simpática. Principalmente graciosa. A própria pessoa da<br />

graça. Graciosíssima. O perfil é assim meio romano: camafeu em cornalina...<br />

<strong>de</strong>pois, cintura fina, abrangível; corpo triangular <strong>de</strong> princesinha egípcia... Mas a<br />

sua maior beleza está nos olhos, olhos gran<strong>de</strong>s, pretíssimos, <strong>de</strong> fenda ampla e<br />

um tanto oblíqua, eletromagnéticos, rasgados quasemente até às têmporas, um<br />

infinitesimalzinho irregulares; lindos! tão lindos, que só po<strong>de</strong>m ser os tais olhos<br />

Ásia-na-América <strong>de</strong> uma pernambucana – pelo menos <strong>de</strong> uma filha <strong>de</strong><br />

pernambucanos, quando nada <strong>de</strong> meia ascendência chegada do Recife...»<br />

Salta aos olhos a beleza física <strong>de</strong> Maria Irma. O seu potencial sedutor.<br />

Com toda essa combinação <strong>de</strong> partes proporcionais e «infinitesimalmente»<br />

assimétricas, há <strong>de</strong> resultar um todo irresistível aos olhos masculinos, que só <strong>de</strong><br />

o contemplar se antepara em êxtase com o gozo dos sentidos enamorados. É <strong>de</strong>

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