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O primeiro desses pensamentos encontra confirmação na música. Sugeri
que a nossa cultura musical requer uma resposta a uma subjetividade que
está além do mundo dos objetos, em um espaço próprio. A música se dirige
a nós, assim como os outros se dirigem a nós. É claro que o sujeito musical
é algo puramente imaginado, assim como o “espaço inútil” no qual ele
ressoa. Ele surge diante de nós como um direcionamento sem nome, uma
intencionalidade sem objeto, o sujeito o qual não tem outra realidade além
desta. Apesar disso, a música se dirige a nós além das fronteiras do mundo
natural.
O segundo desses pensamentos foi sugerido em diversos pontos do meu
raciocínio. A ordem da aliança, sugiro, não pode ficar sozinha como uma
fundação das comunidades humanas duráveis. As sociedades sobrevivem
quando estão assentadas, e o assentamento depende da devoção e do
autossacrifício. A relação eu-você abriga gerações ausentes e outras que não
estão claramente manifestas entre nós. E isso nos leva a fazer sacrifícios em
nome de pessoas que não podem ter essa relação por meio de uma promessa
recíproca. Através dos vínculos “transcendentais” de piedade, entramos no
domínio das coisas sagradas, das obrigações que não podem ser explicadas
em termos de qualquer acordo que fizermos, e que falam de uma ordem
eterna e sobrenatural. E então surge a questão: os nossos encontros com o
sagrado são, em algum sentido, verídicos? Colocando a questão de maneira
simples: será que o sagrado é meramente uma invenção humana, ou ele vem
até nós de Deus?
Arte, literatura e a história registrada da humanidade contam a história
dos nossos anseios religiosos e da nossa busca pelo ser que pode respondêlos.
De onde surge esse anseio? Na ordem da aliança, o amor pelo próximo
cresce para preencher as lacunas entre os nossos acordos. A rede de alianças
nos une em fios seguros, e isso é conforto suficiente? O fato de a nossa
intencionalidade interpessoal se estender em regiões mais metafísicas não é
mais da nossa alçada. Ou, na melhor das hipóteses, o ateu pode nos
conceder, podemos vê-la como uma adaptação, um resíduo de um antigo
sentimento de insegurança que nos faz sempre buscar um amigo ou uma