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A alma do mundo - Roger Scruton

conservadorismo filosofia política

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última para a sua própria existência. Não é uma metáfora falar da vontade

de Deus, tanto quanto é uma metáfora falar da sua própria vontade quando

você procura entender as suas ações. Em nenhum dos casos, isso pressupõe

alguma estranha entidade metafísica, a vontade, que atua como se fosse um

lampejo súbito que põe as coisas em movimento. Pois aquilo que queremos

dizer sobre vontade é a responsabilidade em primeira pessoa que discuti no

capítulo 2. É aquilo que estamos procurando quando, no espaço das razões,

nos perguntamos “por quê?”. Aqueles que veem Deus como o que faz o

mundo existir em um dado momento, por um ato que se ilumina através do

nada primordial como um relâmpago vindo da mão de Zeus, não

compreendem a vontade como ela deve ser compreendida. A história da

criação, como foi recontada no Gênesis, é um dos milhares “mitos de

origem” que têm significado apenas porque podemos reescrevê-los na

linguagem dos motivos em vez de na linguagem das causas. Assim como

me responsabilizo perante a Deus por aquilo que sou e faço, Ele é também

responsável por todos nós pelo mundo em que nos encontramos. A fé

significa a crença, como Abraão acreditava, de que há razão suficiente na

mente de Deus para tudo o que existe e por tudo o que nos é pedido,

inclusive a morte. Portanto, não é surpreendente que a fé seja algo difícil; e

quando a pergunta “por quê?” nos perturba, pisamos cada vez mais na

serpente contorcida que está sob nossos pés.

A pergunta “por quê?” nos é endereçada do eu para você. Ela nos é

confiada naqueles momentos in extremis, quando a ordem da criação

irrompe ao nosso redor. É quando gritamos a Deus — que será quem nos

dirá por que sofremos, por que vivemos e por que morremos. Dentro do

conjunto da natureza existem apenas as causas. Mas, para o olhar da fé, esse

mesmo conjunto tem um telos, uma razão para ser do jeito que é. E ter fé é

crer que a direção teleológica do mundo também prestará contas das minhas

aflições. Na mentalidade do crente, estamos cientes de que o ser não é

simplesmente um fato, mas também um dom, e cientes de que esses dons

têm suas razões. E a resposta da fé é reconhecer que também devemos doar.

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