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luta com Goli<strong>as</strong>, se cal<strong>as</strong>se, não lhe teria sido permitido combater, nem erigir aquele<br />

esplêndido troféu. Impelido pela necessida<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>clarou, e não a seus irmãos, m<strong>as</strong> ao<br />

rei, pois os irmãos não teriam acreditado, visto que a inveja lhes tapava os ouvidos. Por<br />

isso, <strong>de</strong>ixando-os <strong>de</strong> lado, fala àquele que ainda não o invejara.<br />

Péssima coisa é a inveja, digo, péssima e leva à convicção <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezar a própria<br />

salvação. Assim Caim arruinou-se, e antes <strong>de</strong>le o diabo, que levara o pai, Adão, à morte.<br />

Assim, Saul invocara o <strong>de</strong>mônio maligno contra sua alma; e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> chamá-lo, invejava<br />

o médico (cf. 1Sm 18). Tal é a natureza da inveja. Ele sabia que seria salvo por Davi,<br />

m<strong>as</strong> preferia perecer do que ver progredir quem o salvara. O que po<strong>de</strong> haver <strong>de</strong> mais<br />

grave do que esta paixão? Não errará quem afirmar que é filha do diabo; e é o fruto da<br />

vanglória, ou antes a raiz; estes dois vícios costumam corroborar-se mutuamente. Assim,<br />

outrora Saul tinha inveja porque se dizia: “Davi matou <strong>de</strong>z mil” (ib. 7). O que imaginar<br />

<strong>de</strong> mais estulto? Por que invej<strong>as</strong>? – dize-me. Talvez porque um outro foi elogiado? Ora,<br />

era motivo <strong>de</strong> te alegrares. Aliás, não sabes se este elogio é verda<strong>de</strong>iro. L<strong>as</strong>tim<strong>as</strong> o fato<br />

<strong>de</strong> que ele, em nada digno <strong>de</strong> admiração, conseguiu enfim louvores? Ora, <strong>de</strong>vi<strong>as</strong> antes ter<br />

pena. Com efeito, se é bom, ninguém o invejará ao ser louvado, e sim aumentar-lhe-á a<br />

boa fama; se não é tal, por que te atorment<strong>as</strong>? Por que <strong>vol</strong>t<strong>as</strong> o gládio contra ti? Seria<br />

porque diante dos homens é tido por homem ilustre? Ora, os homens <strong>de</strong> hoje já não<br />

existem amanhã. Seria por que obtém glória? Qual, afinal? – dize-me. Aquela da qual diz<br />

o profeta que é flor do campo (cf. Is 40,6)? Por conseguinte, invej<strong>as</strong> esta <strong>de</strong>nominação,<br />

porque não carreg<strong>as</strong> o fardo, nem transport<strong>as</strong> o peso <strong>de</strong>ste feno? Se esta <strong>de</strong>nominação te<br />

parece invejável, por que não o é também a dos lenhadores que diariamente entram na<br />

cida<strong>de</strong> carregando pesos? Este fardo não é melhor do que o da glória, ou até pior.<br />

Só oprime o corpo; o outro causa dano muit<strong>as</strong> vezes à própria alma, e traz mais<br />

ansieda<strong>de</strong> do que prazer. Mesmo que alguém tenha fama <strong>de</strong> eloquente, o temor é maior<br />

do que a alegria por causa da fama; ou antes ela é breve, o temor é perpétuo. M<strong>as</strong> ele,<br />

diante dos príncipes, resplan<strong>de</strong>ce? Daí surgem invej<strong>as</strong> e perigos. Muitos têm idênticos<br />

sentimentos aos teus acerca <strong>de</strong>les. M<strong>as</strong> recebem contínuos elogios? De fato, trata-se <strong>de</strong><br />

cruel servidão. Ele não ousará fazer coisa alguma com liberda<strong>de</strong>, segundo seu modo <strong>de</strong><br />

pensar, a fim <strong>de</strong> não incorrer em ofensa àqueles que o enaltecem; é pesada ca<strong>de</strong>ia ter um<br />

nome ilustre. Por conseguinte, quanto mais for conhecido, tanto mais senhores terá, e<br />

acentuar-se-á a escravidão, porque aparecem senhores <strong>de</strong> toda parte. Ora, o escravo,<br />

quando longe dos olhares <strong>de</strong> seu dono, respira e goza <strong>de</strong> toda liberda<strong>de</strong>; este, porém, em<br />

toda parte encontra senhores; é escravo <strong>de</strong> todos os que encontra na praça. Se ac<strong>as</strong>o<br />

urgir uma necessida<strong>de</strong>, não ousará entrar na praça, a não ser que os servos também o<br />

sigam, a cavalo, e cercado <strong>de</strong> toda a pompa, para que os senhores não o reprovem. Se<br />

vir um amigo sincero, não ousa falar-lhe familiarmente; tem medo <strong>de</strong> que os seus<br />

senhores o privem <strong>de</strong> sua glória. Daí se origina que quanto mais ilustre, tanto maior a<br />

servidão que o oprime. Se sofre algo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sagradável, a ofensa é mais aguda por ser<br />

maior o número d<strong>as</strong> testemunh<strong>as</strong>, e o fato parece ser contra sua dignida<strong>de</strong>. Não é apen<strong>as</strong><br />

injúria, m<strong>as</strong> calamida<strong>de</strong>. Com efeito, se muitos são os que simultaneamente se alegram<br />

com ele, ao fruir <strong>de</strong> algum bem são muitos os que o invejam, sentem ciúmes, e procuram<br />

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