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Pensando o ritual - Sexualidade, Morte, Mundo

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possessão. Entretanto, é legítimo perguntar-se se o nu acadêmico<br />

do século XIX pode ser na verdade definido como erótico.<br />

O processo de revestimento defendido por Klossowski conduz<br />

em última análise a um resultado neoclássico e ultraformal<br />

no qual tudo se abranda na contemplação de belas superfícies,<br />

sem que seja possível ativar nenhum trânsito entre veste e<br />

corpo.<br />

Há, portanto, um limite no revestir, além do qual a própria<br />

noção de veste perde o sentido e se bloqueia numa imobilidade<br />

sepulcral. As cortesãs da antiga Roma — descritas por<br />

Klossowski no seu livro As mulheres romanas — não oferecem<br />

corpos semelhantes a estátuas, mas simulacros de carne que se<br />

agitam, se debatem entre os braços dos espectadores. As escravas<br />

industriais, de que fala Klossowski em outro belíssimo texto<br />

(A moeda viva), referindo-se às modelos fotográficas, às divas<br />

do espetáculo, às pin-up, subtraem o seu corpo à condição de<br />

mercadoria na medida em que o transformam em equivalente<br />

geral do valor de troca, em moeda viva, em meio circulante.<br />

Por isso os grandes intérpretes do erotismo do revestir<br />

não devem ser procurados na pintura acadêmica do século<br />

passado, mas na arte barroca, que considera o movimento um<br />

fator essencial. O trânsito que ela estabelece entre veste e corpo<br />

manifesta-se de duas maneiras fundamentais: no uso erótico<br />

do panejamento, como acontece em Bernini, e na ilustração<br />

do corpo como despojo vivo, como acontece no desenho<br />

anatômico.<br />

Na história da pintura, o panejamento conquista a sua<br />

autonomia muito lentamente. Alberti, na primeira metade do<br />

século XV, em seu tratado De pictura, defende a dependência<br />

do panejamento em relação àquilo que ele cobre: “Nasçam as<br />

dobras como do tronco da árvore, os seu ramos. Nelas, por-<br />

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