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Pensando o ritual - Sexualidade, Morte, Mundo

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possível uma “repetição diferente”. Isso acontece, por exemplo,<br />

nas psicoses e nas neuroses narcisistas; nestas, segundo<br />

Freud, a libido se retira dos objetos externos, não transita mais<br />

através deles e se volta exclusivamente para o Eu. Tal paralisação<br />

obstrui a instituição da relação com o analista e torna<br />

tais doentes inacessíveis à cura. Dessa maneira, a “repetição<br />

diferente” é vista por Freud não só como benéfica, mas como<br />

condição de cura.<br />

As considerações até agora expostas legitimam o pensamento<br />

<strong>ritual</strong> no plano da teoria. Existem, entretanto, motivações<br />

de caráter mais pessoal e autobiográfico que, segundo alguns,<br />

não deveriam entrar em um texto filosófico. Certamente<br />

a mudança literária impressa à linguagem filosófica por Descartes,<br />

por Kierkegaard e, em tempos mais recentes, pelo chamado<br />

“pós-estruturalismo” poderia consentir algumas exceções.<br />

Todavia, se eu me arrisco nesse terreno escorregadio e<br />

tomo a liberdade de dizer alguma coisa a meu respeito, é porque<br />

me sinto impelido, acima de tudo, pelo interesse objetivamente<br />

antropológico naquilo que estou por narrar. Émile<br />

Benveniste, no seu estudo sobre termos relativos ao substantivo<br />

neto, mostra que, em inúmeras sociedades indo-européias<br />

do passado mais remoto, o menino é visto como a encarnação<br />

de um antepassado: o “neto” seria, portanto, uma “repetição<br />

diferente” de alguém que viveu antes. Ora, a experiência infantil<br />

de quem escreve reproduz exatamente o modelo delineado<br />

por Benveniste. Por circunstâncias bastante singulares, eu<br />

tomei o nome, o lugar, as roupas e as brincadeiras de um filho<br />

do meu avô, falecido tragicamente algum tempo antes, e<br />

fui morar com meu avô em vez de morar com meus pais. A<br />

idéia de que os recém-nascidos sejam cópias, simulacros de crianças<br />

desaparecidas, foi, por conseguinte determinante para a

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