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Pensando o ritual - Sexualidade, Morte, Mundo

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No entanto, os historiadores da religião romana observam<br />

que os Manes fazem pesar sobre toda a vida um vago<br />

mal-estar. 7 Hegel observa na história romana uma propensão<br />

a entender a morte na sua dimensão mais exterior e absurda,<br />

como um massacre sem conteúdo, ou seja, como um extermínio<br />

que tem por conteúdo apenas a si mesmo. Um profundo<br />

conhecedor das religiões clássicas, Karl Kerényi, afirma<br />

que, diferentemente do conceito grego de ieron,* o conceito<br />

latino de sacer** indica uma esfera particular do divino<br />

que coincide com o reino da morte. 8<br />

Tudo isso leva a suspeitar que há na religião romana<br />

uma relação com a morte mais profunda e mais substancial<br />

do que as fontes dizem explicitamente. Tal relação não diz respeito<br />

a este ou aquele aspecto particular da religião romana,<br />

mas à sua característica fundamental: a desmitificação, o rito<br />

sem mito. Ela recobre a própria essência da romanidade.<br />

Se — como salienta Dumézil 9 — o pensamento dos<br />

antigos romanos merece atenção e estima, o problema<br />

conceitual do rito desmitificado deve ser pensado nos seus aspectos<br />

filosóficos. De fato, ele representa uma orientação completamente<br />

diferente, seja da concepção trágica da existência<br />

que Heidegger apreende dos gregos, seja da morte iniciática<br />

e do eterno retorno que Eliade lê nas sociedades arcaicas. O<br />

que quer dizer a observância extremamente escrupulosa, quase<br />

obsessiva, de ritos dos quais se ignora o sentido, ou nos quais<br />

este se cala? O que quer dizer o sacrifício a deuses cujos nomes<br />

mal conhecemos e a respeito dos quais não nos preocupamos<br />

em saber se são homens ou mulheres? Pode-se explicar<br />

isso apenas recorrendo a uma deficiência de imaginação,<br />

* Santo, sagrado, de origem divina. (N. do T.)<br />

** Sagrado. (N. do T.)<br />

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