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Pensando o ritual - Sexualidade, Morte, Mundo

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mais possui o aspecto de uma adquisição, de uma conquista,<br />

de uma vitória — revela apenas o nada da possível impossibilidade<br />

da existência. Para Lutero, quem faz da humildade<br />

(humilitas) um mérito cai profundamente na auto-idolatria.<br />

Humilhar-se não quer dizer ser humilde, mas tão-somente “rebaixar-se”<br />

e “anular-se”, 22 ou, melhor ainda, saber ficar na nulidade<br />

da própria condição.<br />

Por mais que Heidegger queira diferençar o seu conceito<br />

de consciência (Gewissen) daquele proposto pela teologia,<br />

as afinidades que ele apresenta com o que Lutero designa<br />

com a mesma palavra são profundas. Em primeiro lugar,<br />

para ambos, ela nada tem a ver com o simples conhecimento,<br />

nem com a acepção que entende a consciência como<br />

auto-evidência do sujeito. Lutero condena expressamente<br />

esse significado em seu comentário ao Magnificat — para<br />

ele, a humildade é ótima só se não for sabedora de si. Os<br />

verdadeiramente humildes nunca vêem a si próprios como<br />

tais. O conhecimento da própria humildade transforma-a em<br />

soberba, em fruição, em auto-afirmação. A vida cristã não é<br />

autoconsciência da própria nulidade, e sim mera nulidade,<br />

cuja consideração cabe eventualmente apenas a Deus. “A cognição”,<br />

diz Lutero, “não é uma força, nem proporciona força,<br />

mas ensina e mostra a nulidade da força e a extensão da<br />

debilidade do homem.” 23 Analogamente, a consciência heideggeriana<br />

é justo o contrário de uma simples presença do<br />

eu para si próprio: a recusa da res cogitans cartesiana constitui<br />

uma das premissas fundamentais sobre as quais se construiu<br />

Ser e tempo. Para Heidegger, não se trata de fundamentar<br />

a ontologia no cogito: a consciência não fundamenta nada,<br />

porém evoca a possibilidade mais própria do ser-aí, isto é, a<br />

morte. O caráter de chamamento (Ruf ) que Heidegger atri-<br />

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