UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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menção do nome carrega um peso simbólico que o sujeito não consegue<br />
sustentar, optando pelo não uso, escandindo este significante.<br />
O julgamento de Esaú, assim como de quase todos os outros<br />
sujeitos entrevistados, é marcado pelo fato de que sua palavra não é<br />
ouvida; ele não é chamado a depor e apenas recebe a punição<br />
diretamente da juíza ou do juiz. Fala também: “nem sei, nem me lembro<br />
de nada, só sei que disseram ‘condenado’ e pronto. Aí não tava nem<br />
sabendo que tava condenado da outra vez”. Esse fato demonstra como<br />
inexiste uma escuta para os acusados de crimes sexuais, escuta que<br />
poderia ser reveladora de seus funcionamentos e motivações, ampliando<br />
a gama de intervenções e prevenções possíveis.<br />
O conceito de violência oferecido por Esaú é metafórico: “é<br />
violência, se uma pessoa não se dá, né? Não tem um ditado, dois boi de<br />
um lado e um puxa de um lado e outro puxa de outro? Não dá certo. Aí<br />
o que que acontece: o que não quer puxar vai apanhar mais. Né? Então<br />
acho que isso aí que é a violência, né? Aí, então, apela pra violência”.<br />
No entanto, fala apenas de violência física ou de discordância entre duas<br />
partes. Notavelmente, seu conceito é bastante parecido com aqueles<br />
desenvolvidos por teóricos sobre a violência, como Hanna Arendt<br />
(1985, p.19), que, concordando com C. Wright Mills, afirma que toda<br />
violência é uma disputa por poder e que o poder mais definitivo é aquele<br />
exercido pela violência. Claramente a resolução de disputas (assim<br />
como afirma Freud no texto “Por que a guerra?”) através da violência<br />
não é a melhor maneira, mas a que vem prevalecendo em nossa<br />
sociedade, sendo passível de mudança. No caso de Esaú, parece ser uma<br />
das vias mais utilizadas por ele para a resolução de seus conflitos:<br />
quando a palavra não é suficiente, utiliza a violência (Gryner et al<br />
2003).<br />
Quando perguntado sobre violência sexual, Esaú não modifica o<br />
que havia falado desde o início da entrevista:<br />
Por que eu ia fazer uma coisa dessa? Um filho<br />
meu, uma filha minha, uma neta minha. Ãh? Tu<br />
me diz uma coisa: como é que eu vou fa... teria<br />
coragem de fazer uma coisa dessa? Jeito nenhum!<br />
O que eu tinha de mulher, pô, à vontade. Por que<br />
que eu ia fazer um negócio, coisa, com família,<br />
próprio com minha família? Jamais. Eu tô<br />
pagando coisa que não fiz. Eu tô consciente na<br />
minha cabeça, já decidi. Eles pra lá, eu pra cá,<br />
entendeu?