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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC

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vê bem o meu processo porque tem processo em<br />

andamento ainda, outro estupro”. “Ah, tens...”.<br />

“Tenho. Não adianta a senhora pedir semiaberto.<br />

Deixa eu ficar aqui mais um pouco”. “Tu queres<br />

ficar aqui?”. “Não quero, né? Eu quero sair<br />

daqui com a cabeça no lugar, né, uma coisa<br />

diferente”. Aí ela disse: “então tá”. Aí cortou<br />

meu pedido de semiaberto. E tô pagando.<br />

Esta pequena passagem é rica em possibilidades de<br />

compreender o que se passa com Quiron. No encarceramento, ele<br />

finalmente se vê às voltas com o Outro, com uma instância maior que o<br />

seu próprio desejo, ainda que na mesma passagem também seja possível<br />

notar como Quiron faz sua vontade de permanecer encarcerado ser<br />

ouvida. Seu desejo continua sendo o único a ser respeitado, mesmo nas<br />

pequenas situações em que tem algum controle dentro da penitenciária.<br />

Ressalto estes pontos na medida em que tenho uma hipótese, a qual,<br />

para os leitores da psicanálise, deve estar clara: em Quiron encontramos<br />

enunciações carregadas dos típicos traços estruturalmente perversos.<br />

Tenho de ressaltar que não falo da perversão dos fetiches ou<br />

mesmo das teorias que compreendem qualquer sexualidade diferente da<br />

heterossexual como sendo perversa. Lacan (1991, p. 100), falando da<br />

obra de Sade, define o que estou entendendo aqui como perverso:<br />

“tomemos como máxima universal de nossa ação o direito de gozar de<br />

outrem, quem quer que seja, como instrumento de nosso prazer”. Este é<br />

o posicionamento de Quiron em relação às suas vítimas, não apenas as<br />

de estupro, mas também aquelas que sofreram assaltos ou que foram<br />

assassinadas.<br />

Para Quiron, a própria violência é conceituada de uma maneira<br />

sutilmente diferente do que aquela encontrada em outros casos<br />

previamente discutidos: “ah, estrupo é violência, matar é violência, eu<br />

já matei mas eu não fui condenado por isso”. O que parece definir a<br />

violência não são os atos em si, mas os efeitos dos mesmos. Para<br />

Quiron, a violência só é reconhecida pela sua punição. A condenação é a<br />

lente pela qual faz a análise de seus crimes; e crime sem punição (ou<br />

reconhecimento), no que indica em suas falas, não é crime.<br />

A questão do reconhecimento social ou judicial da violência<br />

para que se torne efetivamente violência para o sujeito entrevistado<br />

transparece na sua próxima fala: “ah, eu, o cara me devia uma droga na<br />

rua, acabei matando ele por droga, né? Dei dois tiro na cabeça. Aí não<br />

fui condenado porque não me acharam, né? Aí com isso aí eu tenho 17

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