UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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morte – ou, em outras palavras, no inconsciente todo sujeito acredita em<br />
sua própria imortalidade. Isso redunda em uma forte denegação tanto da<br />
violência quanto do incompreensível da inexistência (Freud, 1915, p.<br />
327).<br />
Neste mesmo trecho, Freud oferece uma explicação interessante<br />
sobre a maneira como lidamos com pessoas que estão mortas. Como as<br />
pesquisas realizadas com vítimas de violência sexual apontam que estas<br />
muitas vezes consideram que não existe uma diferenciação entre a morte<br />
e a violência sexual e que os efeitos da violência costumam ser sentidos<br />
como uma aniquilação, a reflexão de Freud pode apontar para a mesma<br />
maneira como lidamos com vítimas de tais crimes, ou seja, “a<br />
consideração pelos mortos, que, afinal de contas, não mais necessitam<br />
dela, é mais importante para nós do que a verdade, e certamente, para a<br />
maioria de nós, do que a consideração pelos vivos” (ibid., p. 328). Esta<br />
ideia parece condizer com a maneira altamente ritualizada que se<br />
encontra na sociedade ao tratar o tema da violência sexual como um<br />
tabu, assim como a morte.<br />
Em um texto posterior, de 1919, Freud, ao alçar-se a pensar as<br />
neuroses de guerra que vinham eclodindo devido à primeira guerra<br />
mundial, nota que o Eu tem um papel nas defesas que são utilizadas,<br />
sendo estas defesas acionadas tanto pelas ameaças externas quanto por<br />
aquelas incorporadas e assumidas pelo próprio ego. Afirma ainda que,<br />
nos tempos de paz, o ego se defende, na verdade, da libido (que, no<br />
contexto deste texto, pode também ser entendida como pulsão), a qual<br />
tem exigências aparentemente ameaçadoras. Em ambos os casos, o ego<br />
teme ser prejudicado, seja por exigências internas ou pela violência<br />
externa (Freud, 1919, p. 263).<br />
Essa divisão entre exterioridade e interioridade, no entanto,<br />
parece não ser realmente representativa do que ocorre. Freud dá alguns<br />
exemplos de como a vida psíquica está vinculada aos fatores externos de<br />
maneira irremediável; exemplo disso são as chamadas neuroses de<br />
guerra, ou neuroses traumáticas: “as neuroses traumáticas de paz ajustarse-ão<br />
também ao esquema, assim que se alcance um resultado positivo<br />
nas investigações que fazemos as relações que sem dúvida existem entre<br />
o medo, a ansiedade [angústia] e a libido narcísica” (Freud, 1919, p.<br />
262).<br />
Um fator de extrema importância para compreender como<br />
Freud chega à conclusão de que estas neuroses de guerra são construídas<br />
é o fato comprovado ao fim da primeira guerra: “com o fim da guerra,<br />
também os neuróticos de guerra desapareceram – prova final mais<br />
impressiva das causas psíquicas das enfermidades” (ibid., p. 270).<br />
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