UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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173<br />
Nesta passagem, o sujeito apela para a família, novamente<br />
tentando uma saída metonímica para se mostrar recuperado. De maneira<br />
interessante, os mesmos argumentos utilizados por Carlos são<br />
comumente encontrados nos depoimentos de estupradores que não<br />
admitem os crimes que cometeram, situação diferente da de Carlos, que<br />
admite e fala do crime. Da mesma maneira, trata o próprio ato<br />
relegando-o a uma simples “bobeira”, uma “bobeira” da qual se<br />
arrepende, mas nada mais que isso, desta maneira diminuindo as<br />
consequências e a própria admissão de responsabilização. Scully &<br />
Marolla (1984, p. 530), em seu estudo com estupradores condenados,<br />
afirmam que é comum o uso deste tipo de estratégias:<br />
Desculpas admitem que o ato foi ruim ou<br />
inapropriado mas negam total responsabilidade,<br />
muitas vezes apela para acidentes ou pulsão<br />
biológica, ou através de bodes expiatórios. Em<br />
contraste, justificativas aceitam a responsabilidade<br />
pelo ato mas negam que ele tenha sido errado –<br />
isto é, eles mostram que naquela situação o ato foi<br />
apropriado. Narrativas são vocabulários<br />
socialmente aprovados que neutralizam o ato ou<br />
suas consequências e são sempre a manifestação<br />
de uma negociação de identidade incipiente 23<br />
(tradução minha).<br />
A utilização de bodes expiatórios é encontrada ao longo de toda<br />
a entrevista com Carlos, aparecendo na forma da bebida, da<br />
interpretação do comportamento das vítimas e mesmo do menor que o<br />
acompanhou no crime, elementos que inclui desde o início de sua<br />
narrativa:<br />
Ah, bebida, né? Foi o ato da besteira, né? Bebida.<br />
Ah, tomei um monte, né? Tava tomando whisky,<br />
tinha tomado um litro de whisky. Natu Nobilis<br />
ainda. Tinha tomado outro Red Bull. Na real, não<br />
23 “Excuses admit the act was bad or inappropriate but deny full responsibility, often<br />
through appeals to accident, or biological drive, or through escapegoating. In contrast,<br />
justifications accept responsibility for the act but deny that it was wrong – that is, they<br />
show in this situation the act was appropriate. Accounts are socially approved<br />
vocabularies that neutralize an act or its consequences and are always a manifestation of<br />
an underlying negotiation of identity”.