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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC

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possibilidade de que qualquer discurso produzido, mesmo em uma<br />

situação de pesquisa, acabe por corroborar e legitimar a pena à qual se<br />

está submetido.<br />

Esta interpelação não é apenas compreendida, mas também<br />

utilizada por outros sujeitos como forma de acessar um poder que<br />

efetivamente, como sujeitos, não poderiam utilizar – no caso, o poder da<br />

voz policial de interpelar um outro. Nas palavras de Tarso: “não queria<br />

pagar meus guri. Aí saí na hora também. Daí não sei como ele<br />

conseguiu botar estrupo, não sei que tipo. Não sei, comprô os homi.<br />

Não sei o que ele fez, só sei que ele conseguiu”. A própria reação de<br />

confusão de Tarso frente à situação já exprime como a sujeição a este<br />

poder opera: como um poder inabalável e impossível de ser enfrentado.<br />

A interpelação feita opera necessariamente uma modificação em sua<br />

posição como sujeito.<br />

Além da questão econômica, Tarso também levanta outra<br />

possibilidade para a acusação de violência sexual efetuada contra ele,<br />

esta envolvendo os laços sociais com seu locatário: “tinha muito ciúme<br />

da família, né? Da convivência, da minha mulher, ele tinha ciúme”,<br />

pois sua família teria “...convivência, a gente saía, vivia bem, saí, curtir,<br />

então ele tinha ciúme de nós”. Outro ponto que Tarso enuncia sobre a<br />

invalidade das acusações se encontra no apoio comunitário que recebeu<br />

ao ser indiciado: “os vizinho, parece que tudo se dava muito bem<br />

comigo, e esse cara não se dava com a vizinhança, quase ninguém<br />

gostava dele. Até a diretora do colégio me falou, que lá foi feito uma<br />

lista, ela testemunhou ao meu favor também a diretora. Diretora me<br />

conhece faz tempo. […] Fez, 600 e poucas pessoas assinaram esse<br />

abaixo-assinado”. Esta movimentação social em torno da defesa de uma<br />

acusação de crime sexual é bastante incomum, mas aparece também no<br />

discurso de outros dos sujeitos desta pesquisa. Utilizam estes fatos para<br />

criar uma imagem masculina de homem trabalhador e, portanto, honesto<br />

segundo as relações simbólicas estabelecidas pela masculinidade<br />

hegemônica de Connell (1997, p. 39) – como maneira de argumentar<br />

que o crime seria impensável. Em contraponto com sua fala anterior<br />

sobre a acolhida que a comunidade teve ante sua acusação, Tarso<br />

afirma: “olha, pensamento, caiu na cadeia o pensamento acabou, o<br />

pensamento é só do marginal. Marginal. Quase todo. Ex-presidiário já<br />

é... a vida é bem mais difícil assim”. Dessa forma, constata que a<br />

modificação exercida pelo ato de enunciação de sua culpa por um crime<br />

para sempre ficará marcada em sua constituição como sujeito, é um ato<br />

performativo, alterou para sempre a realidade discursiva e factível de<br />

sua vida.

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