UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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Freudiano, algo que fica para o sujeito como um inchaço psíquico em<br />
seu sistema libidinal até que seja possível, de alguma maneira – seja a<br />
sublimação ou a resolução pelo retorno do recalque ou o tratamento<br />
psicanalítico –, desfazer o que foi feito. Tenho de adicionar uma crítica<br />
neste momento. Enquanto pensarmos o estupro como se teorizou a<br />
violência no início do percurso psicanalítico – como um irrepresentável<br />
–, nunca será possível uma resolução satisfatória. E tomá-lo assim só<br />
reitera o status quo produzido até então, desfazendo-se qualquer<br />
possibilidade de entendê-lo, sim, como uma linguagem. O ponto<br />
essencial de se entender o estupro como linguagem é que, por esta via,<br />
temos a possibilidade da mudança, da desestabilização, da<br />
desconstrução e da ressignificação radical. Portanto, em termos políticos<br />
e psíquicos, não vejo outra maneira de pensar o estupro senão como uma<br />
linguagem produzida no seio do psiquismo socialmente instituído – e,<br />
como linguagem, passível de ser destronado de seu lugar de imperador<br />
de todos os crimes da sociedade ocidental.<br />
Em toda sua obra, Freud sempre faz uma associação – por vezes<br />
maior ou menor – entre a sexualidade e a agressividade, assim como<br />
marca como em alguns pontos existem também separações entre estas,<br />
mesmo que sejam em geral muito menos teorizadas, como é o caso da<br />
pulsão de dominação, que inicialmente se aplica à dominação em termos<br />
de posse de um objeto, sem que haja aí um investimento sexual. E “essa<br />
associação inerente e natural entre agressividade e sexualidade marca a<br />
inegável influência da segunda sobre a primeira, como também marcará<br />
as desavenças entre ambas” (Endo, 2005, p. 147).<br />
Outro ponto em que recai o olhar de Freud é o da relação entre<br />
agressor e agredido, o qual é explicado principalmente através do<br />
sadomasoquismo. Neste sentido, entende que “os processos violentos,<br />
destrutivos, agressivos sob a forma da mutualidade da implicação<br />
intrínseca e, nesse sentido, uma imbricação radical entre o agressor e a<br />
vítima naqueles processos examinados pela psicanálise” (Endo, 2005, p.<br />
148). Esta é uma visão que foi levada ao seu extremo em algumas linhas<br />
do pensamento psicanalítico – principalmente aquelas influenciadas pela<br />
leitura kleiniana –, resultando na chamada culpabilização da vítima nos<br />
casos de violência, em especial a sexual. Partindo de uma leitura que<br />
considerava as práticas sexuais consensuais seu objeto, é estabelecida –<br />
utilizando-se os mesmos preceitos sem adaptação – uma análise das<br />
práticas não consensuais, resultando em uma situação na qual a<br />
psicanálise é tida como revitimizadora. Esta tendência por vezes é<br />
entendida como replicada no seio de outras linhas da psicanálise por esta<br />
ser uma prática que tem como um de seus cernes a responsabilização do