UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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acusado continua, no fim das contas, a ser um<br />
companheiro, e os auxiliará, apesar da determinação<br />
consciente dele de não se denunciar (Freud, 1974<br />
[1906], p. 113).<br />
A resistência consciente parece ser desligada da inconsciente, e<br />
o trabalho de escuta necessário para que se exponha qualquer uma das<br />
duas é difícil. Mesmo Freud ressalta que a psicanálise (ao menos até<br />
1906) ainda não se havia debruçado sobre este fenômeno, deixando para<br />
que os próprios envolvidos com a temática do crime compreendessem<br />
como isso se dá. Deixa claro que, “em primeiro lugar, terão de<br />
determinar experimentalmente se a resistência consciente denuncia-se<br />
exatamente pelos mesmos indícios que a resistência inconsciente”<br />
(Freud, 1974 [1906], p. 114). Ao longo da experiência clínica analítica,<br />
é possível dizer que a verdade dos sujeitos acaba por transparecer pelas<br />
mesmas construções inconscientes, independentemente da vontade<br />
consciente do sujeito (inclusive, em geral, contrariamente a esta), o que,<br />
em se tratando da pesquisa aqui explanada, fornece outra possibilidade<br />
de se encontrar um discurso que não seja apenas aquilo que os<br />
aprisionados pensam que o pesquisador queira ouvir.<br />
No mesmo texto, Freud alerta para a possibilidade de se<br />
encontrar, entre sujeitos acusados de crimes, alguns que não os<br />
praticaram mas que se sentem neuroticamente impelidos a se colocarem<br />
como culpados. Para tanto, estes se utilizam de uma culpa que advém de<br />
outro tocante, o da neurose. Portanto, “em sua investigação, podem ser<br />
induzidos a erro por um neurótico que, embora inocente, reage como<br />
culpado, devido a um oculto sentimento de culpa já existente nele e que<br />
se apodera da acusação” (Freud, 1974 [1906], p. 114). Não creio ser este<br />
o caso entre os sujeitos que se encontram aprisionados e julgados,<br />
principalmente pelo fato de uma grande parcela declarar-se inocente. Os<br />
que se declaram culpados explicam a situação de maneira clara e não<br />
parecem ocultar nenhuma culpa deste tipo específico.<br />
Em “Reflexões para os tempos de guerra e morte”, Freud<br />
questiona a dinâmica civilizatória. Argumenta que o sujeito, como parte<br />
de uma sociedade, tem de reprimir muitas das pulsões e desejos que<br />
tem, principalmente pelos mais cruentos constituírem crimes, e os de<br />
natureza sexual necessitarem de um manejo socialmente aceitável da<br />
situação. Ao pensar o que acontece quando estas pressões civilizatórias<br />
não se colocam sobre os sujeitos, Freud indica que<br />
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Quando a comunidade não levanta mais objeções,