UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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Este assumir do qual Carlos fala é onde reside um dos maiores<br />
imbróglios enunciativos. Assume o que fez, mas coloca uma série de<br />
justificativas, desculpas e motivações externas a si próprio como<br />
maneira de se expiar da culpa pelo crime. Em praticamente tudo que<br />
concerne ao crime que cometeu, continua a repetir estes artefatos<br />
enunciativos.<br />
Bandeira (1999, p. 361-367) elabora alguns pressupostos acerca<br />
da violência sexual que podem ser interessantes para compreender o<br />
caso de Carlos: 1) o estupro é uma violência sexual vista como ação que<br />
envolve certo grau de racionalização, através de uma ação pensada,<br />
apesar da forma obcecada como o agressor age, guiado por impulsos que<br />
são colocados como incontroláveis; 2) há uma relação entre a prática de<br />
estupro e a possibilidade de se exercer força e poder sobre a mulher<br />
violentada; 3) o estupro é um ato narcísico do agressor para com sua<br />
vítima; e 4) ao praticar o estupro, o agressor atua simbolicamente como<br />
um desejo de morte.<br />
Usando como prerrogativa o último ponto levantado por<br />
Bandeira (1999), podemos tomar esta repetição como tendo sentido ou<br />
valor para Carlos. Pena (2007, p. 84) pensa a repetição nestes termos: “a<br />
presença da repetição ultrapassa os limites do tratamento analítico, pois<br />
ela está presente na vida de todas as pessoas e revela um caráter<br />
pulsional, portanto, inerente à condição humana”. Este caráter pulsional<br />
que neste momento se encontra voltado ao discurso parece desembocar<br />
na questão do controle da própria fala, numa tentativa reiterada a todo o<br />
tempo de manter seu discurso coeso (e consequentemente<br />
estereotipado).<br />
Ao ser questionado se já havia sentido alguma vontade de<br />
cometer um estupro ou se o prospecto lhe parecia excitante, o sujeito<br />
responde:<br />
Nunca, nunca. Não precisava disso, nunca<br />
precisei. Tinha duas mulher na rua. Aí eu morava<br />
com uma e tava na casa da outra. Eu sempre...<br />
ninguém dos meus irmãos, da minha família, dos<br />
meus amigos... Agora que eu saí, aí teve um<br />
monte que me defendeu. Disse: “ô, não acredito<br />
que tu fez isso, monstro”; “não acredito”. Um<br />
monte aí, o cara aí sempre cheio de mulher na<br />
rua direto, tudo pra cama, direto assim aí, hm,<br />
sempre cheio de mulher. Cinco, seis namorada