UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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performatividade da masculinidade atravessam o discurso destes<br />
sujeitos, sempre pelos mesmos temas já identificados por Gutmann &<br />
Vigoya (2005) em sua revisão dos estudos realizados sobre<br />
masculinidade na América Latina: paternidade e família,<br />
homossocialidade, construção da identidade através de condutas<br />
estereotípicas – como nunca chorar, ter de ser o melhor, sempre<br />
competir, ser forte, impossibilidade de envolvimento emocional, nunca<br />
recuar (ibidem, p. 119) –, saúde sexual e reprodutiva, raça e etnia,<br />
trabalho e o próprio machismo.<br />
Neste caso, o que é observado é a utilização do discurso sobre o<br />
trabalho como forma de se vincular à imagem de homem correto, que<br />
aparentemente significa, para este sujeito, que quem trabalha<br />
automaticamente não comete crimes nem se envolve com violência,<br />
muito menos a sexual. A lógica é obviamente falaciosa. Outra<br />
interpretação para essa insistência em se declarar recuperado advém do<br />
estudo de Polaschek & Gannon (2004), que concluem que “geralmente<br />
se presume que agressores sexuais estão preocupados em fazer uma boa<br />
impressão” 22 (ibidem, p. 312; tradução minha). Criar uma boa impressão<br />
parece ser exatamente aquilo que o sujeito tenta fazer de todas as<br />
maneiras. Ao se colocar como um empreendedor, como regenerado,<br />
nada mais faz do que tentar retirar-se do lugar de estuprador. A sua<br />
repetição constante desta enunciação parece incluir um fator de<br />
soslaiamento, de esquiva da própria situação que vive. Quando<br />
perguntado por que motivo acredita estar recuperado, replica:<br />
Porque eu aprendi muitas coisa. Quando eu tava<br />
solto na rua, antes de cometer esse crime. Depois<br />
que foi bobeira minha, palhaçada, né? Nem devia<br />
ter. Entre aspas, né? Não precisaria estar nessa<br />
vida. Sou trabalhador, tenho carteira assinada,<br />
marceneiro. Trabalho, fichar, sempre trabalhei<br />
fichado. Aí eu acho que porque que eu tô<br />
recuperado, porque eu tenho minha família me<br />
acompanhando. Minha mulher, minha mulher não<br />
me abandonou ainda, ainda não, né? Tá me<br />
acompanhando aí até hoje. Tenho um filho...<br />
tenho dois filho, uma filha também. Claro que me<br />
arrependo de ter acontecido, mas foi um ato de<br />
bobeira o que aconteceu. No momento, aí, foi um<br />
ato de bobeira, entendeu?<br />
22 “It is often assumed that sex offenders are concerned with making a good impression”.