UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
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A partir deste momento, no entanto, entra em jogo outro fator.<br />
Como referido anteriormente por Segato (1999), a interlocução com<br />
outros homens é importante especialmente para homens jovens, e é<br />
exatamente por esta via que a situação descrita pelo sujeito entrevistado<br />
se delineia: “estrangulei, quebrei o pescoço, enterrei. Aí, depois de<br />
alguns dia, foi eu e um colega meu lá; pegou, já estrupou a vítima de<br />
novo. [...] Aí levei um camarada meu lá pra ver. Desenterrou. Acabou<br />
se excitando com a guria morta, transou com a guria, enterrou de novo.<br />
Fui no orelhão, chamei a polícia”. Não apenas a interlocução aqui<br />
ocorre como também um compartilhamento do abuso sexual, mesmo<br />
que tenha ocorrido com a vítima já morta. O próprio sujeito define o que<br />
seu colega fez como um estupro, esclarecendo que, em sua visão, a<br />
violação estava novamente sendo perpetrada.<br />
Nesta passagem se encontra também a primeira instância em<br />
que Quiron relata uma situação que se repete reiteradamente: após o<br />
término do ato criminal propriamente dito, dirige-se até um telefone<br />
público, liga para a polícia e descreve o que ocorreu, onde se encontra o<br />
corpo (nos casos em que se aplica), o que a vítima sofreu, além de<br />
fornecer uma descrição de si mesmo dizendo que havia visto tal pessoa<br />
no momento e nas redondezas onde havia ocorrido o crime. Sobre a<br />
motivação que teria para fazer algo que claramente o envolveria em um<br />
crime, Quiron apenas fala:<br />
Chamei a polícia, disse onde tava o local<br />
certinho. Aí foro lá, acharo ela. [...] Num sei. Fui<br />
no orelhão, deu vontade, chamei a polícia.<br />
“Policial, tem uma guria enterrada assim, assim,<br />
assim, que foi estrupada. Vocês lá vocês<br />
encontro”. Até uma guria que eu matei também.<br />
Mas essa eu não estrupei.<br />
O “deu vontade” é importante nesta frase, indicando<br />
necessariamente um desejo que parece quase irresistível ao sujeito,<br />
mesmo que seja contrário a qualquer lógica aparente. Novamente vemos<br />
aqui a articulação da perversão no fato do sujeito invocar um<br />
barramento pela lei de diversas maneiras. Chamar a polícia, ser julgado,<br />
declarar-se culpado e contar os detalhes sórdidos do crime são todas<br />
maneiras que o sujeito encontra de permanecer barrado, se não<br />
simbolicamente, conjurado na realidade.<br />
Neste momento da entrevista, começa a falar sobre um<br />
assassinato que cometeu no qual também achou que seria preso ou