UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA ... - CFH - UFSC
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
175<br />
identificação política quase imutável – maculada pela presença de um<br />
dos crimes considerados mais irracionais e danosos. Para uma melhor<br />
compreensão destas consequências, cabe salientar que não é necessária a<br />
apresentação da estrutura ou traços da perversão – Mascarello (2009) se<br />
utiliza do conceito de constelações clínicas para a articulação das<br />
variadas características presentes quando utilizamos o conceito do Real<br />
lacaniano na clínica ou no estudo de um caso – para que um sujeito<br />
consiga exercer uma violência sexual. Na verdade, uma das hipóteses<br />
trabalhadas nesta dissertação delimita exatamente o contrário: que é,<br />
sim, possível a qualquer sujeito, independentemente da constelação<br />
clínica apresentada, cometer um crime de tamanha violência.<br />
O que diverge essencialmente do que encontramos no sujeito<br />
atrelado ao perverso é a capacidade de representar aquilo que foi<br />
cometido. A quantidade de desculpas e de justificativas encontradas no<br />
discurso de Carlos é indicativa desta irrepresentabilidade. Ela não é<br />
total, visto que o sujeito consegue elaborar, falar sobre e comentar o que<br />
se passou. No entanto, algo de significante não é elaborado, não<br />
ultrapassa este limite e vira Real, pois isto seria altamente<br />
desestruturante para o sujeito, que, então, convive com o que fez<br />
construindo todas estas noções discursivas e enunciando-as com o<br />
objetivo de, assim, de alguma maneira simbolizá-las (mesmo que muitas<br />
vezes pobremente representadas, ilógicas, falaciosas e frágeis).<br />
Inicialmente o sujeito continua a se recusar a fala sobre o crime<br />
em si, mesmo que dando uma visão geral; e apela para a leitura do<br />
processo. O processo não é de interesse algum para este trabalho, visto<br />
que a verdade jurídica produzida é uma, e o discurso do sujeito outra.<br />
Este discurso, suas enunciações, detalhes, atos falhos e formações do<br />
inconsciente que promovem um entendimento mais complexo destes<br />
crimes – a verdade jurídica (que, em todo caso, já foi produzida e<br />
performada) nada tem a ver com isto ou com os intuitos investigativos<br />
da presente dissertação:<br />
O que aconteceu é que ele queria vender o carro,<br />
né? E, antes disso, daí o de menor já começou a<br />
abusar de uma, daí pá. O cara chegou e disse:<br />
“aí, se tu não fazer também, vai ficar sozinho,<br />
maluco”. Cara tá com a arma na mão. [...] Ah, e<br />
daí eu tava com a outra na frente, daí começou.<br />
Não sei o que aconteceu. Isso aí já tá no processo,<br />
daí.