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Confissões do pastor - Caio Fábio

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quinhentos apoios antes de ir para a cama e passar a noite toda em claro, absolutamente insone,<br />

pulan<strong>do</strong> fora <strong>do</strong> leito com raiva e fazen<strong>do</strong> ab<strong>do</strong>minais até a exaustão.<br />

Tu<strong>do</strong> o que eu queria era que a tal da passagem chegasse logo e que eu pudesse ir para<br />

Manaus. Aí eu me perguntava: “Que qui cê vai fazer em Manaus, bicho? Cê já tá aqui, por que<br />

num vai logo vê a mina em São Paulo?” O fato é que eu não tinha resposta para a minha<br />

necessidade de voltar a Manaus. Eu não tinha nada lá. A família era um detalhe emocional na<br />

minha vida e história, por que então voltar? Eu não sabia responder.<br />

Quan<strong>do</strong> tio Renato <strong>Fábio</strong> me telefonou dizen<strong>do</strong> que a passagem estava disponível, juntei<br />

meus trapos e fui para a casa dele em Copacabana. Fiquei no mesmo quarto em eu havia <strong>do</strong>rmi<strong>do</strong><br />

oito anos antes, quan<strong>do</strong> chegara de Manaus no meio da depressão que nossa família vivera. As<br />

recordações daqueles sentimentos não me deixaram <strong>do</strong>rmir, além <strong>do</strong> que os o<strong>do</strong>res concentra<strong>do</strong>s<br />

nos porões <strong>do</strong>s eleva<strong>do</strong>res eram ainda os mesmos. Por isso, com mais força ainda, a minha<br />

desgraçada olfatividade remeteu-me a uma viagem onde muitos personagens e emoções<br />

reavivaram-se com extrema força, inclusive meus pais.<br />

Às cinco da manhã tio Renato me acor<strong>do</strong>u de minha insônia e me levou no seu DKV até o<br />

Galeão. Viajei oito horas e cheguei a Manaus às quatro horas da tarde. Fui o último a sair <strong>do</strong> avião.<br />

Minhas mãos estavam geladas e eu me sentia como se tivesse de brigar uma “briga contratada”,<br />

com hora e lugar marca<strong>do</strong>s. Só não sabia quem seriam os adversários. Aliás, se eles estivessem lá,<br />

não saberia como enfrentá-los e, se não estivessem, não saberia como enfrentar-me. Sentia me<strong>do</strong><br />

de que estivessem e pavor de que não estivessem.<br />

Eles estavam enfileira<strong>do</strong>s. Aninha, Luiz, Suely, mamãe e papai. Do mais novo ao mais velho.<br />

Era uma interessante escada de emoções. Ia de alguém por quem não tinha nenhum<br />

ressentimento, a Aninha; até aquele por quem eu não sabia mais o que sentia, papai. As mulheres<br />

choravam. Luiz estava páli<strong>do</strong> e cala<strong>do</strong>, seu mo<strong>do</strong> discreto de dizer que estava abaladíssimo. E<br />

papai se mostrava estranho. De um la<strong>do</strong> estava feliz, transparecia isso nos olhos; mas de outro<br />

la<strong>do</strong> se revelava nervoso, com as mãos suadas e os lábios um tanto sem cor. Parecia que ele não<br />

conseguia ficar sem se encher de esperança com minha volta, mas ao mesmo tempo estava<br />

apavora<strong>do</strong> de que eu tivesse volta<strong>do</strong> apenas para viver novas loucuras e assim morrer<br />

precocemente.

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