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produto, ten<strong>do</strong> lhe falta<strong>do</strong> a energia: a fé. Se o fabricante precisa subir o preço, é só pedir mais<br />
pelo produto. Ele pode valer tu<strong>do</strong>, pois a demanda é ditada pela necessidade <strong>do</strong> coração, e este<br />
não mede sacrifícios para encontrar coisas que o introduzam à possibilidade <strong>do</strong> amor, da alegria,<br />
da prosperidade, da saúde ou <strong>do</strong> fim de alguma crise que lhe tire o sono, roube-lhe uma paixão ou<br />
o afaste de um sonho obsessivo.<br />
A fé, todavia, abre portas para tu<strong>do</strong> isto. E quem não dá tu<strong>do</strong> o que tem para comprar tais<br />
tesouros? Num país como o Brasil, e muitos outros <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> Terceiro Mun<strong>do</strong>, especialmente,<br />
a oferta da fé, como coisa a ser comprada, tem um apelo extraordinário. Muito mais eficiente <strong>do</strong><br />
que para os revolucionários marxistas <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, quanto mais miséria, pobreza, crise, angústia e<br />
me<strong>do</strong>, melhor — mas muito melhor mesmo. Isto porque se paga pela fé exatamente o preço que o<br />
desejo de se livrar da <strong>do</strong>r impõe. Em tempos de calamidade, dá-se o que se tem por um recurso<br />
que move montanhas, seca rios, pára o sol, faz pão cair <strong>do</strong> céu e cura toda enfermidade. E nesse<br />
senti<strong>do</strong>, o Brasil tem si<strong>do</strong> um paraíso nos últimos trinta anos.<br />
O <strong>pastor</strong> Mariel, de Dias Gomes, foi um ilumina<strong>do</strong> espertalhão. Religioso e velhaco, ele<br />
combinou carisma e tortuosidade de caráter a fim de criar uma religião quase evangélica, porém<br />
marcada por uma teologia de aparência pentecostal, ainda que cheia de conteú<strong>do</strong>s de natureza<br />
pagã extremamente perversa. Para Mariel, a vontade de Cristo se confundia com a sua própria<br />
vontade, e a Bíblia era apenas um livro que ele usava ao seu bel-prazer, ainda que seus conteú<strong>do</strong>s<br />
não fossem jamais objeto de reflexão ou apreciação. Mariel tinha si<strong>do</strong> feito para aquela hora, e a<br />
hora fora criada para Mariel.<br />
Com o anúncio na mídia de que a Rede Globo lançaria uma novela que seria uma<br />
caracterização de Edir Mace<strong>do</strong> e sua igreja, a Universal iniciou imediatamente uma ação no<br />
senti<strong>do</strong> de estabelecer um enfrentamento. O problema é que assim fazen<strong>do</strong> eles vestiram a<br />
carapuça. Quan<strong>do</strong> espernearam, o Brasil inteiro disse: “Serviu.” Ao perceberem o erro de<br />
marketing que haviam cometi<strong>do</strong>, mudaram brilhantemente a estratégia.<br />
— Esta novela é uma agressão a toda a Igreja Evangélica. Temos que nos unir e lutar contra a<br />
Globo porque esse é o início da perseguição contra o povo de Deus — disseram eles no programa<br />
25ª Hora e em suas mídias, especialmente o rádio.<br />
Eu já havia me posiciona<strong>do</strong> contra a inclusão <strong>do</strong>s <strong>pastor</strong>es evangélicos no estereótipo <strong>do</strong> tal<br />
<strong>pastor</strong> Mariel, de Decadência. Que há muitos Mariéis disfarça<strong>do</strong>s de <strong>pastor</strong>es, não há dúvida.<br />
Somente um ser muito estúpi<strong>do</strong> ou radicalmente fanatiza<strong>do</strong> poderia ter a coragem de negar esse<br />
fato. Entretanto, os Mariéis estão longe de ser maioria. Ao contrário, aqueles que vivem com<br />
dignidade e honram o evangelho mediante uma vida limpa e sóbria são tantos, que seria ridículo<br />
pretender que a figura <strong>do</strong> <strong>pastor</strong> de Decadência pudesse caber como definição de um típico<br />
<strong>pastor</strong> evangélico.<br />
A virada na ênfase de que Decadência fosse um ataque à liderança da Universal, mas, ao<br />
contrário, revelasse uma tentativa de desmoralização de todas as igrejas e to<strong>do</strong>s os <strong>pastor</strong>es<br />
evangélicos <strong>do</strong> Brasil por parte da Globo, foi brilhante e rápida. Assim agin<strong>do</strong>, a Universal fez<br />
com que a maioria <strong>do</strong>s <strong>pastor</strong>es que fazem o gênero Mariel procurassem imediatamente abrigo à<br />
sombra <strong>do</strong>s bispos de Edir Mace<strong>do</strong> ou de sua Rede Record de televisão. E mais que isto: muitos<br />
outros <strong>pastor</strong>es, que não tinham nenhuma identificação com as práticas da Universal, foram para<br />
lá, atraí<strong>do</strong>s pelo me<strong>do</strong> da falada “perseguição contra os <strong>pastor</strong>es”.<br />
A mania de perseguição que existe entre os evangélicos é o fenômeno mais forte a unir o<br />
grupo to<strong>do</strong>. Durante to<strong>do</strong>s esses anos de circulação no meio cristão, verifico, aturdi<strong>do</strong>, que<br />
mesmo a centralidade de Cristo e a referência máxima da Bíblia não têm tanta capacidade de unir<br />
os diferentes no nosso meio quanto uma boa “onda de perseguição”. Quan<strong>do</strong> isso acontece,<br />
mesmo os hereges se unem, e aqueles que se acusam de práticas completamente inaceitáveis