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Confissões do pastor - Caio Fábio

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Capítulo 17<br />

“O único desejo que <strong>do</strong>minava a minha busca por deleite era simplesmente amar e<br />

ser ama<strong>do</strong>. Porém, nenhuma restrição foi imposta pela troca de mente com mente,<br />

que marca a caminhada brilhantemente iluminada da amizade. Nuvens de<br />

enlameada concupiscência carnal encharcavam o ar. Os impulsos borbulhantes da<br />

puberdade desceram numa névoa sobre os meus olhos e obscureceram os meus<br />

senti<strong>do</strong>s, de tal forma que eu perdi a capacidade de distinguir entre a serenidade <strong>do</strong><br />

amor e a escuridão da luxúria.”<br />

Santo Agostinho, <strong>Confissões</strong><br />

Alipinho, Celsinho e eu estávamos em permanente busca e transformação. Pinho começou<br />

a se interessar por meditação transcendental e nos convenceu a fazer com ele alguns exercícios<br />

de respiração e tentativa de sair <strong>do</strong> corpo. Celsinho era mais acadêmico na busca de valores<br />

espirituais. Gostava de psicologia e amava os livros de Hermann Hesse.<br />

Eu, de minha parte, era um filósofo da esquina, das sensações, das emoções e das<br />

experiências. Eu queria tu<strong>do</strong> aquilo que pudesse ser prova<strong>do</strong> pelos meus senti<strong>do</strong>s. Por isso,<br />

gostava muito das conversas filosóficas às quais nos permitíamos nos fins de noite, mas o que me<br />

empolgava mesmo era viajar por alguma via mental diferente, em geral produzida pelas drogas e<br />

vivida em situações de excitamento, fosse o perigo ou o sexo.<br />

Foi nessa época que um cara muito louco, alguns anos mais velho <strong>do</strong> que nós três, entrou em<br />

nossas vidas. Nós o chamávamos de Carioca porque ele era <strong>do</strong> Rio e fazia questão de falar<br />

carregan<strong>do</strong> no sotaque preguiçoso e arrasta<strong>do</strong> da moçada da zona sul da Cidade Maravilhosa.<br />

Carioca era um arquiteto que deixara tu<strong>do</strong> para viver como hippie. Fazia permanentemente a<br />

rota Rio—Venezuela—Panamá—Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e, na volta, sempre passava por Manaus. Ele era<br />

a pessoa mais maluca que já havíamos encontra<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong> o conhecemos, ele estava passan<strong>do</strong><br />

uma temporada maior em nossa cidade, dizia estar procuran<strong>do</strong> novas formas de viagens<br />

psicodélicas e falou-nos sobre as maravilhas <strong>do</strong> ayahuasca, suco de raízes indígenas de poder<br />

alucinógeno.<br />

Carioca tinha belos olhos azuis, mas de bonito era só o que tinha. No mais, era feio, torto,<br />

tinha uma voz estranha e ria com ar de ratinho. Ele era uma figura. Com aquela cara, ele não<br />

poderia entrar em lugar nenhum da alta sociedade. Mas como tínhamos cacife, impúnhamos a<br />

presença dele onde quer que fôssemos.<br />

Naqueles dias, nós três havíamos si<strong>do</strong> convida<strong>do</strong>s a desfilar como modelos de algumas lojas<br />

da Zona Franca. O pagamento era feito em roupas. Para nós, estava ótimo. Afinal, além das

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