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Confissões do pastor - Caio Fábio

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aloira<strong>do</strong> de praia e to<strong>do</strong> encaracola<strong>do</strong>. O corpo magro, já a milímetros de um metro e oitenta, me<br />

destacava da maioria <strong>do</strong>s amazonenses, em geral bem mais baixos. As calças eram coloridas, tipo<br />

“carne-seca”, de teci<strong>do</strong> franzi<strong>do</strong> e sem zíper, deixan<strong>do</strong> os pêlos púbicos expostos. Os sapatos<br />

eram <strong>do</strong> “Souza”, no Rio, e o jeito de andar era provocativo, com a cabeça erguida, como se<br />

tentasse sentir um cheiro que passava acima de mim. Os braços alternavam-se de mo<strong>do</strong><br />

cadencia<strong>do</strong>, mas sacudi<strong>do</strong>s de mo<strong>do</strong> reto, in<strong>do</strong> da altura da perna até quase o nível da cabeça, e as<br />

pernas davam passos largos, como que desejan<strong>do</strong> engolir o chão.<br />

Mais <strong>do</strong> que roupas extravagantes, eu tinha uma vontade íntima de chocar as pessoas e suas<br />

formas conserva<strong>do</strong>ras de interpretar a vida. Assim era que eu saía de casa, na rua Sete de<br />

Dezembro, e andava de cueca Zazá, completamente cavada dentro das nádegas, apenas com<br />

aquela fitinha preta aparecen<strong>do</strong> nas laterais e cobrin<strong>do</strong> os órgãos genitais. Nada mais.<br />

Eu desfilava três quilômetros pela cidade cheia de gente, perceben<strong>do</strong> os arrepios que as<br />

senhoras sentiam nas janelas, os olhares irrita<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s mari<strong>do</strong>s, os sorrisos mal<strong>do</strong>sos das garotas e<br />

as piadas odiosas <strong>do</strong>s garotos que não tinham coragem de fazer o que eu estava fazen<strong>do</strong>. Mais de<br />

uma vez policiais me pararam e me deram voz de prisão por atenta<strong>do</strong> ao pu<strong>do</strong>r. Eu pedia que me<br />

prendessem, mas sempre aparecia alguém para dizer: “Eu conheço esse rapaz, é filho <strong>do</strong> Dr.<br />

<strong>Caio</strong>. Não faz nada com ele não.” E eu continuava meu caminho de escândalo e provocação.<br />

À porta <strong>do</strong>s bancos, eu parava e plantava bananeira, mostran<strong>do</strong> meu traseiro para os gerentes<br />

e dizen<strong>do</strong> que eles não sabiam o que era viver com aquela liberdade. Enfim, minha presença em<br />

Manaus passou a ser desconcertante, provocativa e impossível de não ser percebida. E aqui e ali<br />

eu ouvia os mais velhos dizerem: “Coita<strong>do</strong> <strong>do</strong> Dr. <strong>Fábio</strong>. Como é que um homem tão bom como<br />

ele foi ter um neto tão desavergonha<strong>do</strong> como esse? Se estivesse vivo, morreria de vergonha.”<br />

Quan<strong>do</strong> cheguei ao Ideal Clube naquele primeiro dia, já entrei disposto a marcar minha<br />

presença entre os meus conterrâneos como um caça<strong>do</strong>r de meninas bonitas. Meu primo José<br />

<strong>Fábio</strong> havia me informa<strong>do</strong>, logo na entrada, que a menina mais cobiçada <strong>do</strong> lugar naqueles dias<br />

era uma tal de Regininha, e mesmo sob a “luz negra” foi possível identificá-la no salão. Depois de<br />

dançar com garotas diferentes, mirei minha presa e parti pra cima. Tirei-a para dançar, rocei<br />

meu corpo no dela como pude, inebriei-me com o perfume importa<strong>do</strong> que ela usava e senti o<br />

cheiro <strong>do</strong>ce <strong>do</strong> seu hálito. No dia seguinte, eu estava à porta de sua casa, em frente à praça da<br />

Saudade, e já saí dali na condição de namora<strong>do</strong> da garota mais desejada no círculo das vaidades.<br />

O namoro com Regina foi insosso e cansativo. Mas como ela era mais velha <strong>do</strong> que eu e<br />

cortejada por rapazes também mais velhos, nós <strong>do</strong>is percebemos que éramos úteis um ao outro.<br />

Eu aproveitava o status que o namoro com ela me dava junto aos rapazes — que morriam de inveja<br />

de minha súbita e ousada conquista —, e ela se servia <strong>do</strong> fato de que namorar um cara novo no<br />

pedaço não a comprometia com a política local de conquistas, ao mesmo tempo em que elevava<br />

seu padrão. Em outras palavras, o que ela estava dizen<strong>do</strong> era: “Meu negócio é gente diferente,<br />

capaz de romper com os padrões da terrinha.” Nosso namoro terminou em <strong>do</strong>is meses, no<br />

máximo, mas os trunfos da conquista tiveram repercussões extraordinárias.<br />

Nos meses seguintes eu não fiz outra coisa a não ser namorar pelo menos uma nova garota a<br />

cada semana, fora os amassos que aconteciam de mo<strong>do</strong> fortuito em cada festa a que eu ia. Às<br />

vezes eu me via namoran<strong>do</strong> duas ou três meninas ao mesmo tempo, e achava o máximo a<br />

ginástica de ter de enganar e satisfazer a todas elas.<br />

Tu<strong>do</strong> aquilo acontecia em razão <strong>do</strong> charme e da propaganda. De outra forma, nada se<br />

materializaria. Afinal, eu era o garoto mais “duro” em circulação, pois a situação em casa estava<br />

péssima. Dinheiro já era lembrança de um tempo que eu sabia que não voltaria nunca mais. Além<br />

disso, papai e mamãe estavam preocupadíssimos com o caminho que minha vida estava toman<strong>do</strong><br />

e, portanto, mesmo quan<strong>do</strong> tinham algum troca<strong>do</strong>, não me davam, temen<strong>do</strong> que eu usasse o

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