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Confissões do pastor - Caio Fábio

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cilindradas. Nós só nos cumprimentávamos: “Como é que é, bicho?”, era o que ele dizia quan<strong>do</strong><br />

passava por mim.<br />

Amigos mais comporta<strong>do</strong>s sempre diziam que Alipinho, Celsinho e eu devíamos ficar longe<br />

de Zé Curió, que tinha fama de ser bandi<strong>do</strong>, traficante de muambas, de remédio para impotência,<br />

de filmes pornográficos, de maconha e, segun<strong>do</strong> diziam, até de cocaína, quan<strong>do</strong> dava. Com uma<br />

apresentação daquela, o cara ficou irresistível. Eu decidi que queria ficar amigo dele.<br />

Um dia nos encontramos na porta de uma boate e conversamos longa e gostosamente. O<br />

sujeito era bem-humora<strong>do</strong>, gozadíssimo, inteligente, autodidata, cheio de prosopopéias e bon<br />

vivant. Gostava de tu<strong>do</strong> o que era bom. Tinha gosto sofistica<strong>do</strong> para lanchas, carros e mulheres.<br />

E, além de ser considera<strong>do</strong> o melhor motociclista da cidade, ainda tinha um jipinho Citroën igual<br />

ao que Jean-Paul Belmon<strong>do</strong> usara num de seus filmes. Era um sucesso.<br />

Zé Curió era de origem humilde, mas aparentemente não tinha nenhum complexo de<br />

inferioridade. Era considera<strong>do</strong> de confiança por homens ricos da cidade, para quem conseguia<br />

filmes pornográficos e meninas novinhas, que ele primeiro experimentava e depois servia aos<br />

amigos ricos, fazen<strong>do</strong> assim um jogo político e diplomático que sempre lhe auferia resulta<strong>do</strong>s<br />

extraordinários nos negócios. Quan<strong>do</strong> comecei a andar com ele, muita gente na cidade afastou-se<br />

de mim. Digo de mim porque, ainda que Pinho e Celsinho também andassem junto, era eu que,<br />

pela total liberdade de que dispunha, passava muito mais tempo com Curió.<br />

Alipinho e Celsinho, por mais que tivessem uma vida fora <strong>do</strong>s padrões da orto<strong>do</strong>xia social,<br />

eram ainda pessoas normais: iam à escola, faziam cursos à tarde, comiam com os pais e estavam<br />

se preparan<strong>do</strong> para o vestibular. Eu, entretanto, havia para<strong>do</strong> de estudar em 1971 e dizia que<br />

jamais voltaria a uma classe de escola. Por isso, minha vagabundagem encontrou em Zé Curió o<br />

exemplo mais prático da maturidade e da realização. Eu queria viver como ele vivia. Sem hora<br />

para nada. Capaz de <strong>do</strong>rmir até às duas da tarde e depois ir viven<strong>do</strong> conforme as oportunidades<br />

fossem aparecen<strong>do</strong>.<br />

Com Curió, minha vida enlouqueceu de vez. Todas as tardes saíamos com meninas de<br />

programa e passávamos horas fazen<strong>do</strong> sexo e toman<strong>do</strong> drogas. Ao pôr-<strong>do</strong>-sol, enquanto eu fugia<br />

da “árvore de minhas angústias”, ele ganhava algum dinheiro, fazia algumas entregas e depois me<br />

levava para comer uma caldeirada de tucunaré. Usávamos mais drogas e, então, vinha a hora de<br />

dançar.<br />

No fim da noite, quase sempre dávamos carona para algumas meninas na boate e acabávamos<br />

em algum motel de beira de estrada ou no apartamento dele, no centro da cidade. Provavelmente,<br />

nenhum outro garoto de 17 anos da cidade tinha aquela vida de orgias e desarvoramento. Por isso,<br />

passei, gradativamente, a fazer amizade com gente cada vez mais velha <strong>do</strong> que eu.<br />

As mulheres de Zé Curió eram de to<strong>do</strong> tipo. Algumas eram prostitutas de trinta a 35 anos.<br />

Outras eram meninas que tinham perdi<strong>do</strong> a virgindade recentemente, e que o procuravam como<br />

alguém generoso e engraça<strong>do</strong>, sempre disposto a tratar o sexo feminino com o melhor que<br />

estivesse ao seu alcance. Além disso, ele gostava da boa vida, e as meninas sabiam disso. As<br />

vantagens que minha companhia trazia para Zé era que, comigo, o nível das conquistas femininas<br />

subia de piso, quase sempre varian<strong>do</strong> entre a classe média e a alta. E àquele “outro mun<strong>do</strong>” ele<br />

servia, mas em geral não usava. Por isso, quan<strong>do</strong> via meninas que ele desejava e não conseguia, às<br />

vezes me dizia: “Pega aquela ali, usa, e depois passa para mim.”<br />

Mas, foi na condição de usuário das meninas <strong>do</strong> Curió que eu acabei pegan<strong>do</strong> três horríveis<br />

gonorréias, que foram devidamente tratadas com muito Benzetacil pelo Dr. Joede Cavalcanti de<br />

Oliveira. Joede era evangélico e amigo de minha família. Mas o que mais me chamava a atenção<br />

era que ele tinha prazer em me encostar contra a parede de sua casa, aplicar aquela seringa cheia<br />

daquele líqui<strong>do</strong> torturantemente <strong>do</strong>loroso e espesso como óleo em mim, para então dizer com ar

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