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Confissões do pastor - Caio Fábio

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ele está tentan<strong>do</strong> falar para agradar os <strong>do</strong>is la<strong>do</strong>s: a sociedade (dizen<strong>do</strong> que tá erra<strong>do</strong>), e a polícia<br />

(dizen<strong>do</strong> que a gente precisa entender o cabo). Isto é perigoso — respondi, esquecen<strong>do</strong> que 1994<br />

havia acaba<strong>do</strong> e que já estávamos em 1995, tempo no qual já não se podia mais falar à vontade.<br />

Daquele dia em diante, passei a ser um <strong>do</strong>s repercuti<strong>do</strong>res de matéria sobre o governa<strong>do</strong>r e o<br />

prefeito. Falava muitas vezes com tom crítico, mas também elogiava todas as ações que me<br />

pareciam boas. E para provar isto, tenho inúmeros recortes de jornal que evidenciam tanto uma<br />

coisa quanto a outra. Fazen<strong>do</strong> assim, achei que estava apenas sen<strong>do</strong> cidadão. E como não era<br />

partidariamente político, mas apenas um <strong>pastor</strong>, imaginava que não seria jamais visto como<br />

inimigo <strong>do</strong> indivíduo circunstancialmente eleva<strong>do</strong> à posição de autoridade, fosse o governa<strong>do</strong>r ou<br />

o prefeito.<br />

— Sou apenas um cidadão com voz e com capacidade crítica construtiva — disse mais de<br />

uma vez quan<strong>do</strong> me perguntavam acerca de minhas “participações políticas”.<br />

Então começaram a vir os sinais de que eu estava equivoca<strong>do</strong>. O convênio <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> com a<br />

AEVB para a capelania nos presídios foi cancela<strong>do</strong> e nossas carteiras para visitação em<br />

penitenciárias foram invalidadas.<br />

— <strong>Caio</strong>, a gente tem que conversar. E não dá pra ser por telefone. Dá pra ser hoje no almoço?<br />

— perguntou Rubem César em mea<strong>do</strong>s de março. Encontramo-nos num restaurante próximo à<br />

ladeira da Glória. — Eu tenho uma pessoa amiga, que trabalha no palácio <strong>do</strong> governo, que me<br />

disse que os assessores chega<strong>do</strong>s ao Marcello andam dizen<strong>do</strong> que vão pegar você — disse-me<br />

Rubem com ar de muita preocupação.<br />

— Não pode ser. Junto dele também tem gente que me conhece. É o caso <strong>do</strong> coronel Ferraz<br />

e <strong>do</strong> comandante Dorazil, da Polícia Militar, ambos evangélicos. Eles não deixariam o governa<strong>do</strong>r<br />

ficar engana<strong>do</strong> a meu respeito — falei, tentan<strong>do</strong> me convencer de que aquilo tu<strong>do</strong> não passava de<br />

fofoca palaciana.<br />

— Olha, tem mais. O Alfre<strong>do</strong> me telefonou pedin<strong>do</strong> pra eu te dar um reca<strong>do</strong>.<br />

— Ah, é! O quê?<br />

— O César Maia disse a ele que, num papo com o cardeal e o presidente <strong>do</strong> Tribunal, o<br />

governa<strong>do</strong>r Marcello Alencar falou muito mal de você e da Fábrica de Esperança. Disse que você<br />

é um picareta, oportunista, que defende bandi<strong>do</strong>s como parte de uma estratégia política <strong>do</strong><br />

Coman<strong>do</strong> Vermelho e que a Fábrica é uma fachada.<br />

— Diz pro Alfre<strong>do</strong> que eu quero falar com ele.<br />

— Liga pra ele. Foi ele que me pediu pra te falar isso. Eu acho que ele não vai ligar de você<br />

perguntar sobre o assunto.<br />

Dois dias depois, Alfre<strong>do</strong> e eu estávamos almoça<strong>do</strong> no restaurante Alcaparras, no Aterro <strong>do</strong><br />

Flamengo.<br />

— Eu conheço você e sei quais são as suas motivações. Mas fiquei preocupa<strong>do</strong> que num papo<br />

entre o governa<strong>do</strong>r, o prefeito, o cardeal e o presidente <strong>do</strong> Tribunal você tenha si<strong>do</strong> janta<strong>do</strong> de<br />

uma vez. São homens de muito poder e você deveria tentar saber o que está acontecen<strong>do</strong>. Se eu<br />

fosse você, iria falar com o Marcello — disse meu amigo de dentro da Prefeitura.<br />

Eu tinha esta<strong>do</strong> com Marcello Alencar no início <strong>do</strong> ano. Havia encontra<strong>do</strong> com ele na<br />

companhia de meu amigo Eduar<strong>do</strong> Mascarenhas, psicanalista e deputa<strong>do</strong> federal pelo PSDB.<br />

Naquela ocasião, minha visita tivera duplo objetivo: mostrar para ele que eu não mordia e saber se<br />

o esta<strong>do</strong> tinha qualquer interesse em fazer parcerias sociais com a Fábrica. A idéia era que<br />

empresas vinculadas à Fábrica pudessem receber incentivos fiscais especiais <strong>do</strong> governo. Fui<br />

bem-recebi<strong>do</strong>, mas não deu em nada.<br />

— Bom, eu já estive com ele uma vez. Vou tentar marcar outra audiência. Só que agora o<br />

assunto será este — falei a Alfre<strong>do</strong>.

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