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Confissões do pastor - Caio Fábio

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ambiciosos e os que querem saber as coisas da vida ficassem to<strong>do</strong>s saben<strong>do</strong> que Jesus é o centro<br />

desse Universo. Jesus é o Rei da Vida — ele afirmou aos gritos, cheio de paixão, saltan<strong>do</strong> e dan<strong>do</strong><br />

murros no ar. Parecia que ele estava falan<strong>do</strong> com o planeta to<strong>do</strong> naquela hora e, ao mesmo tempo,<br />

eu senti como se fosse só para mim.<br />

“Meu Deus, eu já sei por que eu estou perdi<strong>do</strong>! É porque não tenho esse centro na minha vida.<br />

Eu sou como um astro vagan<strong>do</strong> sem órbita pela escuridão da noite. É assim que eu me sinto, Deus”,<br />

exclamei de mim para mim mesmo, inician<strong>do</strong> um choro solitário, convulsivo e <strong>do</strong>lori<strong>do</strong>.<br />

Fiquei aproximadamente 15 minutos entregue àquele pranto. Quan<strong>do</strong> me recompus, percebi<br />

que o garoto sem nome estava lá, a uns cinco metros de mim, choran<strong>do</strong> muito também. Quan<strong>do</strong><br />

levantei, o <strong>pastor</strong> estava convocan<strong>do</strong> os “arrependi<strong>do</strong>s” para ir à frente e confessar a Cristo,<br />

publicamente, como Senhor e Salva<strong>do</strong>r. Mas eu não tinha condições de ir à frente. Mesmo agora<br />

— naqueles súbitos e eletrizantes minutos de arrependimento — queria Jesus, mas continuava a<br />

ter fortíssimos preconceitos contra toda forma de religião organizada. Dei um abraço no rapaz.<br />

— Valeu, bicho. Valeu, mermo — disse, enquanto batia no ombro dele e me retirava.<br />

Fui direto à casa de Alda. Ela estava angustiada. Já havia telefona<strong>do</strong> para as delegacias,<br />

hospitais e até para o necrotério. Ouvi o desabafo alivia<strong>do</strong> dela e contei o que havia aconteci<strong>do</strong>.<br />

— Olha, agora eu sei por que eu sou tão <strong>do</strong>i<strong>do</strong> — disse. — É porque eu tenho fome de Deus.<br />

Só vou me encontrar se for nele. Fora dele, eu estou perdi<strong>do</strong>.<br />

Ela me olhou e falou como se estivesse com aquela resposta na ponta da língua desde a<br />

infância.<br />

— Eu também sou Dele. Sei que Ele me ama e quero conhecê-Lo. Se você está in<strong>do</strong>, eu vou<br />

junto — afirmou com estranha convicção.<br />

Despedi-me dela e vaguei pela cidade deixan<strong>do</strong> o ar fresco da noite me gelar a face. Senti os<br />

aromas das estradas da periferia me invadirem a alma com a força de coisas novas que estavam<br />

prestes a acontecer. Quan<strong>do</strong> entrei na garagem da casa de meus pais, já eram umas duas da<br />

manhã. Vi a cama-de-campanha na qual eu <strong>do</strong>rmia armada embaixo da janela. A lua estava<br />

absolutamente cheia. Era uma bola prateada, quase irreal de tão linda.<br />

Dali de minha pequena cama percebi que a lua estava desenhan<strong>do</strong> uma silhueta parecida com<br />

aquela que o pôr-<strong>do</strong>-sol pintava atrás da mangueira sagrada <strong>do</strong> quintal da vovó. Agora, entretanto,<br />

era uma grande jaqueira que deixava o luar pintá-la de pratea<strong>do</strong>, enquanto resplandecia de mo<strong>do</strong><br />

mágico ante meus olhos. Era como se uma antiga e obsessiva visão tivesse volta<strong>do</strong>, com toda a sua<br />

força e sedução. Dessa vez, todavia, aquela árvore iluminada não me falava de um ser distante, de<br />

alguém para se sentir saudade. Não! O sentimento que me invadia ali — olhan<strong>do</strong> para aquele<br />

espetáculo da natureza, pinta<strong>do</strong> que estava pelas projeções de minha alma e pelos sonhos<br />

secretos de meu espírito — era o de que minha jornada de angústias, desejos, seduções,<br />

ansiedades, insônias, loucuras e coragens suicidas estava chegan<strong>do</strong> ao fim. De alguma forma,<br />

instalara-se dentro de mim a convicção de que naquela noite, naquela igreja de gente estranha, eu<br />

havia encontra<strong>do</strong> o Alguém de quem sentira saudade consciente desde os sete anos de idade. Fora<br />

na busca Dele que eu me pervertera, me desqualificara, me equivocara e quase me<br />

auto-aniquilara. Mas agora Ele estava ali, presente não na jaqueira, mas no meu quarto, e<br />

andan<strong>do</strong> para dentro de mim.<br />

“Jesus, mamãe me disse outro dia que Tu vieste a este mun<strong>do</strong> buscar e salvar gente perdida.<br />

Então, se o Teu negócio é com gente perdida, eu acho que sou o sujeito ideal para ser acha<strong>do</strong>.<br />

Acha-me, por favor, Jesus”, eu orei, posto de joelhos, olhan<strong>do</strong> na direção da Sarça Ardente que<br />

me acompanhara desde há muito.<br />

Deitei de la<strong>do</strong>, volta<strong>do</strong> para a jaqueira iluminada, e não percebi quan<strong>do</strong> a<strong>do</strong>rmeci. Às seis e<br />

quarenta e cinco da manhã a vizinhança toda ouviu um grito lancinante de pavor e desespero.

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