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Confissões do pastor - Caio Fábio

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Capítulo 47<br />

“Tinhas feri<strong>do</strong> nosso coração com Teu amor, e lá levávamos Tuas palavras<br />

cravadas em nossas entranhas; reuniam-se no fun<strong>do</strong> de nosso ser numa espécie de<br />

fogueira, que inflamava e consumia nosso torpor, para que o vento da contradição<br />

das línguas <strong>do</strong>losas não apagasse a chama em nós, antes nos incendiasse mais<br />

ardentemente.”<br />

Santo Agostinho, <strong>Confissões</strong><br />

Em setembro de 1994 a mídia começou a falar mais explicitamente em “intervenção federal<br />

no Rio”. O assunto era, no mínimo, confuso e profundamente controverso. Para uns, soava como<br />

a grande chance de desmoralizar o governo <strong>do</strong> PDT, de Leonel Brizola, no Rio de Janeiro. Para<br />

outros, era apenas uma questão de simplismo pragmático, calça<strong>do</strong> na idéia de que o Exército<br />

tinha consegui<strong>do</strong> acalmar o Rio durante a conferência internacional Eco 92, razão pela qual<br />

poderia voltar a fazê-lo. Tolice.<br />

— Gregório, o que você acha disso? — perguntei ao Gor<strong>do</strong>, agora preso no complexo da rua<br />

Frei Caneca.<br />

— Reveren<strong>do</strong>, eles estão loucos. Fazen<strong>do</strong> assim eles correm o risco de desmoralizar as<br />

forças armadas e ainda sofisticar o crime. Os “meninos” vão ficar mais espertos, os solda<strong>do</strong>s vão<br />

ser corrompi<strong>do</strong>s, os “grupos” que estão organiza<strong>do</strong>s em uma ou duas favelas numa região vão<br />

acabar fican<strong>do</strong> uni<strong>do</strong>s a outros grupos espalha<strong>do</strong>s pela cidade. Não sei, não. Vai ser pior — disse o<br />

Gor<strong>do</strong>.<br />

Rubem César não queria a intervenção, mas apenas uma ação coordenada das várias polícias<br />

trabalhan<strong>do</strong> juntas, especialmente nas divisas, coibin<strong>do</strong> a entrada de drogas e armas. Entretanto,<br />

no Viva Rio havia também visões pessoais diferentes da dele. E alguns <strong>do</strong>s que pensavam com<br />

outros interesses emitiam suas opiniões na mídia não em nome <strong>do</strong> Viva Rio, mas a partir de suas<br />

bases de operação, fossem políticas, comerciais ou empresariais. Assim, ficava a impressão de<br />

que a intervenção era uma bandeira <strong>do</strong> movimento.<br />

Conversas freqüentes com Artur Lavigne deixaram Rubem César completamente<br />

convenci<strong>do</strong> de que a interpretação que Nilo tinha <strong>do</strong>s fatos estava correta. Desde o início daquele<br />

ano Rubem vinha conversan<strong>do</strong> regularmente com o então secretário de Justiça, de quem ouvira<br />

coisas que estavam totalmente de acor<strong>do</strong> com a ordem <strong>do</strong>s fatos, ou seja: ações meramente<br />

repressivas nas favelas não passavam de um cansativo, humilhante e custoso mo<strong>do</strong> de enxugar<br />

gelo. Era preciso reprimir o crime, mas era mais imperativo ainda fazê-lo nas suas causas<br />

gera<strong>do</strong>ras e no seu modus operandi, e não apenas na ponta pobre <strong>do</strong> processo: a favela.

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