23.04.2013 Views

Confissões do pastor - Caio Fábio

Confissões do pastor - Caio Fábio

Confissões do pastor - Caio Fábio

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

então que, numa viagem pela Alemanha, Alda falou-me que estava grávida outra vez. Só que dessa<br />

vez, além de tê-la deprimi<strong>do</strong>, a gravidez produziu o mesmo impacto em mim.<br />

— Mas como? Você não faz tabela? É muito filho em tão pouco tempo. O Ciro só tem um ano<br />

e meio e o Davi tá com sete meses. Como é que isso foi acontecer? — perguntei num ataque de<br />

idiotice, como se não soubesse como aquelas coisas aconteciam.<br />

— O problema é que você só me permite evitar filhos pela tabela. É muito arrisca<strong>do</strong>. Eu<br />

precisava tomar pílula — ela disse, lembran<strong>do</strong>-me de meu radicalismo evangélico, comum nos<br />

anos setenta, de afirmar que a pílula não era de Deus.<br />

— Pílula não! É artificial. Eu não concor<strong>do</strong>. Além disso, temos de confiar que Deus sabe<br />

tu<strong>do</strong> e, se Ele quer nos dar mais um filho, sabe o que está fazen<strong>do</strong> — falei, contradizen<strong>do</strong> meu<br />

discurso anterior, e assumin<strong>do</strong> minha postura <strong>pastor</strong>al.<br />

— Mas se a gente fosse deixar tu<strong>do</strong> pra natureza e pra providência de Deus, a gente tava<br />

lasca<strong>do</strong>. A gente não faz assim com relação às outras coisas, como trabalho, estu<strong>do</strong>, profissão e<br />

muitas outras coisas. Por que no sexo e na procriação a gente tem de ser naturalista e cheio desse<br />

calvinismo <strong>do</strong> qual você tanto fala? — ela me provocou de mo<strong>do</strong> inteligente.<br />

— É que filhos são vida. E esse assunto Deus cuida de mo<strong>do</strong> diferente — falei sem muita<br />

convicção, uma vez que no fun<strong>do</strong> <strong>do</strong> coração concordava com ela. Só não estava era com<br />

disposição de ter de enfrentar meu pai com uma teologia de procriação diferente da dele e <strong>do</strong>s<br />

demais <strong>pastor</strong>es de Manaus, naquele tempo.<br />

— Filhos são vida, mas as outras coisas são essenciais pra vida da gente também. Olha, você<br />

pode me dizer um milhão de vezes que as coisas são diferentes, mas meu coração não aceita. Eu<br />

sei que estou certa — ela concluiu, dan<strong>do</strong> a entender que não queria discutir mais o assunto.<br />

Fazia muito frio em Hamburgo naquela noite. Dormimos mal. Ouvi ela dar umas choradinhas<br />

bem discretas e senti borboletas voarem dentro de mim a noite toda.<br />

De volta a Portugal, algo ruim começou a acontecer. Todas as noites comecei a sentir uma<br />

presença espiritual maligna rondan<strong>do</strong> o nosso quarto. Podia sentir aquele cheiro característico de<br />

inhaca de demônio. Ciro foi o primeiro a sofrer os resulta<strong>do</strong>s daquela opressão. Começou a se<br />

agitar durante o sono, sempre na mesma hora em que eu sentia aquela presença no quarto. Ele se<br />

contorcia, gemia, chorava de angústia, abria os olhos, apontava na direção <strong>do</strong> canto <strong>do</strong> quarto e<br />

gritava. Eu o pegava no colo e orava com ele, mas sua agitação não cessava. Então eu o colocava no<br />

meu la<strong>do</strong> da cama, ajoelhava-me, impunha as mãos sobre ele e repreendia em voz alta toda e<br />

qualquer presença demoníaca naquela Casa <strong>do</strong>s Pene<strong>do</strong>s. Depois de alguns dias é que fiquei<br />

saben<strong>do</strong> pelo caseiro que havia <strong>do</strong>is quartos fecha<strong>do</strong>s no porão da mansão porque eles ouviam e<br />

viam vultos assusta<strong>do</strong>res sempre que abriam aqueles aposentos.<br />

Andei pela casa oran<strong>do</strong> e repreenden<strong>do</strong> aquelas sombras espirituais. Jejuei e orei com<br />

intensidade até que tu<strong>do</strong> aquilo cessou. Foi somente depois daqueles dias de escuridão que<br />

conseguimos relaxar outra vez e tentar aproveitar os últimos dias na Europa. Então, voltamos ao<br />

Amazonas.<br />

— A Aldinha vai ter neném, não vai, <strong>Caio</strong>zinho? — papai me perguntou.<br />

— Hum? — indaguei constrangi<strong>do</strong>, pois Alda e eu havíamos combina<strong>do</strong>, ainda na Europa,<br />

que não diríamos a ninguém que ela estava grávida até que a barriga o dissesse. Não<br />

agüentávamos ouvir as pessoas dizen<strong>do</strong>: “Coitadinha, tão novinha e já com três filhos. Que pena!”<br />

— Tá sim, mas como é que o senhor sabe? — indaguei.<br />

— É que Deus me falou em sonhos. Eu estava <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong> no mês passa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> vi você de<br />

joelhos num quarto grande, antigo e bem-decora<strong>do</strong>, o Cirinho choran<strong>do</strong> muito e Alda deitada na<br />

cama, deprimida e angustiada. Você chorava e orava. Então ouvi uma voz que dizia: “Ore por eles,<br />

pois Alda está grávida e não está aceitan<strong>do</strong>.” Acordei sua mãe e oramos até de madrugada. Depois

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!