Faça aqui o download do texto na integra em pdf. - R1 - UFRRJ
Faça aqui o download do texto na integra em pdf. - R1 - UFRRJ
Faça aqui o download do texto na integra em pdf. - R1 - UFRRJ
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
chamada “classe média” (FERNANDES & CARNEIRO, 1994). A análise da trajetória das<br />
ONGs históricas revela o pre<strong>do</strong>mínio de lideranças que tiveram acesso à boa formação<br />
acadêmica e política. Muitas vezes, a experiência prévia com projetos de<br />
desenvolvimento, <strong>em</strong> organismos inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is, ou as relações firmadas com atores de<br />
organizações de fi<strong>na</strong>nciamento <strong>do</strong>s países ricos atuam como facilita<strong>do</strong>res da viabilidade<br />
fi<strong>na</strong>nceira das suas propostas. Embora sejam porta<strong>do</strong>res de um discurso crítico com<br />
relação aos mo<strong>do</strong>s estabeleci<strong>do</strong>s de condução das ações <strong>em</strong> prol <strong>do</strong> desenvolvimento, a<br />
sua orig<strong>em</strong> lhes garante, <strong>na</strong>s esferas de debate mais convencio<strong>na</strong>is – supostamente<br />
refratárias a novidades e mudanças – um nível de compreensão dificilmente alcança<strong>do</strong><br />
pelos atores das organizações de movimentos sociais que, de um mo<strong>do</strong> geral, são tão<br />
dependentes de media<strong>do</strong>res para ser<strong>em</strong> b<strong>em</strong> sucedi<strong>do</strong>s <strong>em</strong> mesas de negociação. Os<br />
agentes das ONGs são profissio<strong>na</strong>is que, obviamente, <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>m a linguag<strong>em</strong> política e,<br />
não raro, também a linguag<strong>em</strong> acadêmica. Essa possibilidade de interlocução b<strong>em</strong><br />
sucedida ilustra a histórica das influências recíprocas entre as distintas propostas sobre a<br />
promoção <strong>do</strong> desenvolvimento e a visibilidade e o alcance social das idéias, digamos,<br />
alter<strong>na</strong>tivas.<br />
Para compreender melhor esta interação complexa entre distintas propostas,<br />
convém imagi<strong>na</strong>rmos que as redes de discursos críticos, articuladas pelas ONGs,<br />
perpassam distintos mo<strong>do</strong>s pelos quais são construídas as mudanças <strong>na</strong>s estruturas<br />
sociais. Deste mo<strong>do</strong>, estes discursos tanto se mesclam às mudanças latentes que vêm<br />
das bases da sociedade e são atribuídas aos movimentos sociais e às suas organizações<br />
quanto influenciam e são influencia<strong>do</strong>s pelas mudanças latentes ou manifestas<br />
origi<strong>na</strong>das da ação que ocorre nos meios político-administrativo e acadêmico. 67 No<br />
primeiro caso, ocorre um tipo de interação mais direta com atores que estão<br />
participan<strong>do</strong> de mudanças cotidia<strong>na</strong>s (muitas delas estimuladas pela ação das próprias<br />
ONGs), provocadas pela introdução de novos costumes, mo<strong>do</strong>s de vida, formas de<br />
relacio<strong>na</strong>mento político ou mo<strong>do</strong>s de organização da produção. Neste caso, as redes de<br />
discurso tend<strong>em</strong> a ser mais horizontalizadas, prevalecen<strong>do</strong>, geralmente, uma maior<br />
partilha <strong>do</strong> poder de decisão entre os distintos atores envolvi<strong>do</strong>s. No segun<strong>do</strong> caso,<br />
ocorre uma interação discursiva mais indireta, da qual participam atores cuja função<br />
social é conduzir mudanças ou reformas de mo<strong>do</strong> planeja<strong>do</strong>, provocadas por ações<br />
gover<strong>na</strong>mentais, administrativas ou educacio<strong>na</strong>is. Neste caso, as redes discursivas por<br />
onde circulam propostas críticas ou alter<strong>na</strong>tivas tend<strong>em</strong> a ser mais verticalizadas,<br />
adentran<strong>do</strong> ca<strong>na</strong>is de comunicação mais institucio<strong>na</strong>liza<strong>do</strong>s, nos quais, geralmente, há<br />
uma hierarquização mais marcada e a partilha <strong>do</strong> poder decisório sobre mudanças é<br />
mais b<strong>em</strong> definida e centralizada.<br />
Desta maneira, a estratégia das ONGs para a socialização de discursos que<br />
buscam repensar o desenvolvimento ocorre por diversas direções e diferentes níveis,<br />
buscan<strong>do</strong>, entre distintos atores, angariar reconhecimento e legitimidade para a sua ação<br />
e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, afirmar a identidade <strong>do</strong>s que constro<strong>em</strong> tais discursos alter<strong>na</strong>tivos.<br />
Se, por um la<strong>do</strong>, as ONGs e as organizações de movimentos sociais traz<strong>em</strong> à ce<strong>na</strong><br />
“novas formas de fazer política” (RICCI, 2002), expandin<strong>do</strong> o <strong>do</strong>mínio político para<br />
abranger determi<strong>na</strong><strong>do</strong>s valores e práticas cotidia<strong>na</strong>s consideradas inova<strong>do</strong>ras, também é<br />
verdade que, por outro la<strong>do</strong>, têm que adentrar os ca<strong>na</strong>is políticos convencio<strong>na</strong>is com um<br />
67 “Mudança social latente” e “mudança social manifesta” são categorias utilizadas por STOMPKA (1998, p.464)<br />
para explicar o mo<strong>do</strong> como elas ocorr<strong>em</strong> <strong>na</strong> sociedade, enfatizan<strong>do</strong> o papel <strong>do</strong>s movimentos sociais <strong>em</strong> seu<br />
desencadeamento.<br />
93