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do ordenamento jurídico, seja explicitamente, na ordenação das relações familiares, como chefe de família, seja num deslocamento simbólico, transferido para a autoridade papal ou do chefe de Estado, Soberano, Deus, enfim substitutos hierárquicos da autoridade pater “. 235 Pensar a representação da paternidade 236 no campo jurídico possibilita, de uma parte, compreender o poder de regulamentação do Direito, a autoridade simbólica do Estado, do ordenamento jurídico, o poder do discurso, de outra, dá indicativos do status jurídico da mulher no Direito e como este, conforme já aludido, não apenas tem gênero, é sexista, como largamente afirmam as teorias feministas no campo da Sociologia Jurídica, mas serve como estratégia criadora de gênero, ordenando lugares, definindo para além da autoridade da Constituição dando validez à constituição. E esta autoridade imaginária, “com o poder de ordenar a obrigação da obediência, foi sempre referida à figura paterna, ou seja, a uma metáfora do pai, representada por Deus, o Papa, o Rei ou o próprio pai [...]” In: BARROS, Fernanda Otoni de. Do direito ao pai. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 7. A apelação ao pai de família para justificar a fonte das fontes no ordenamento jurídico também está posta nos postulados de Bobbio na sua discussão acerca do Direito Natural. Recorrendo a John Locke, Bobbio afirma que é no direito de criação, na relação entre pais e filhos que se busca o primeiro modo de legitimação do poder. “È desse poder que ele deriva a fonte do Direto Natural que, segundo Locke, é perpétuo, válido em todos os tempos, e universal, válido para todos os homens”. In: BARROS. Op. cit, p. 25. 235 Idem, p. 24. 236 Ainda que a psicanálise toma a representação da paternidade enquanto função paterna, a qual pode ser exercida por ambos os sexos (pai ou mãe), historicamente no Direito essa função está representada na figura masculina. Já na Bíblia o pai aparece como legítimo representante de Deus, cabendo-lhe o poder de vida e morte sobre o filho (Abraão oferece seu filho em sacrifício a Deus). O panorama da família romana dos primeiros séculos também não difere muito. Ao chefe de família, ao pater, é que caberiam os rumos das relações familiares. Toda a ascensão social e movimento do cidadão romano dentro de uma sociedade eram necessariamente subordinados ao pai de família, que decidia sobre a vida e morte do filho, emancipação, casamento, etc. A lei suprema dentro da família romana era o pai. O direito canônico, por sua vez, também repousa nessa referência da organização familiar centrada na figura paterna. É no princípio patriarcal que repousa a autoridade organizadora da família, cujo princípio, orienta a vida social durante a Idade Média: o papado enquanto autoridade máxima em termos de justiça; seguindo-se a este o Estado, de característica soberana em sua organização, e, por fim, a família, de inspiração divina, em que o pai é sucessor natural de Deus. O Direito pouco visa ao cidadão enquanto sujeito individual. Está este posto entre os interesses do Estado, da Igreja e da família, inexistindo praticamente as noções de direitos e garantias individuais. 114
identidades, criando e re(criando) estereótipos que apontam para a natural ambigüidade da figura feminina. 237 Como assinala Nicole Arnaud-Duc, “as relações de forças masculino/feminino fazem parte de um jogo de trocas, de interpretações entre sistema social e sistema jurídico, no próprio âmago das contradições”. 238 Se a igualdade jurídica coloca-se, desde Aristóteles, em termos de desigualdades consideradas naturais, porque derivadas da própria natureza das coisas, o século XIX está fundado na liberdade, na igualdade e na autonomia do sujeito. O Direito deve, portanto, adaptar o seu discurso à evolução dos costumes ligados às alterações econômicas e políticas em vigor. Os juristas irão legitimar a desigualdade de tratamento segundo o sexo no pressuposto de que as mulheres desejam e necessitam ser protegidas contra si mesmas. Por conseguinte, o mesmo discurso que se mostra protetor, em face das criaturas voluntariamente fragilizadas, também denunciava uma vertigem perante a força nelas pressentida. Haveria legitimidade na reivindicação de direitos cujo objetivo fosse tornar as mulheres melhores esposas e mães. O Direito emitia, dessa forma, a imagem da mulher ideal construída sobre o modelo da mãe de família burguesa, o que pode ser visto como um fator de exclusão social para aquelas mulheres vivendo à margem da célula familiar. 237 Esta questão será retomada no capítulo 3, a partir de uma perspectiva do Direito Penal. 238 In: DUBY; PERROT. História das mulheres no ocidente, p.97. 115
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SUÁREZ, Mireya; SILVA, Ana Paula P
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