A Construção do “ser médico” - Centro de Referência e Treinamento ...

14
“É um câncer antigo, avançado, mas tudo tem tratamento. Eu
não sou Deus, mas como médico vou fazer tudo que puder,
tudo que tiver de tratamento disponível. Vamos investigar
toda a situação, e também vamos ter fé, né? Vamos lutar
juntos! Já tive situações bem piores... Se todos os meus
pacientes morressem eu não agüentaria, largaria a oncologia.
Cada situação é única. Vamos conversar sempre sobre tudo,
vamos estar juntos.” [Médico 2/Ago/ 2005]
Cinco meses depois o médico (da segunda cena), que havia
desenvolvido uma boa relação com seu paciente, não conversou sobre
“tudo” e não conseguiu “estar junto” nos momentos de proximidade da morte
do paciente. Dificuldades de sua rotina atribulada? Ou outras dificuldades?
Não sabemos...
Sabemos dos muitos desejos e dúvidas que acompanham os
estudantes e residentes entrevistados no enfrentamento do processo de
morte de seus pacientes; eles fazem parte do corpo e da alma deste escrito.
A maneira encontrada para buscar pistas que nos levem a uma
direção que possibilite o “estar junto” entre os médicos e seus pacientes
(que assim desejem), foi o que nos levou a tentar compreender no processo
de construção do “ser médico”, a sua relação com a morte. Espera-se com
esta tese contribuir para a compreensão do modo como tal relação participa
na promoção do distanciamento da dimensão do cuidado no cotidiano da
prática médica.
Propor o diálogo sobre o lugar da morte no processo de construção
do “ser médico” com alunos de medicina talvez possa contribuir para
melhorar a qualidade de vida e de morte presente na prática médica.
Feita esta introdução, e tendo justificado nossos propósitos, incluímos
um breve percurso realizado pela saga da ciência médica, a fim de ilustrar o