1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país
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As classes conservadoras – às quais o vulgo dava tempos atrás o apodo amolecado mas<br />
pitoresco <strong>de</strong> classes conversadoras – se têm mostrado, <strong>de</strong> modo geral, tímidas e minimalistas,<br />
contentando-se com medidas relacionadas exclusivamente com os interesses da classe.<br />
Nesse sentido, embora diminuto, é sintomático o fato noticiado pelo “O Estado <strong>de</strong> S. Paulo”<br />
(25-4-87), <strong>de</strong> que a Fe<strong>de</strong>ração dos Diretores e Lojistas do Estado <strong>de</strong> São Paulo está começando a<br />
mobilizar seus associados e outras fe<strong>de</strong>rações para lutar contra um lobby formado por empresas <strong>de</strong><br />
gran<strong>de</strong> porte que visam a aprovação <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> lei permitindo a abertura do comércio aos<br />
domingos.<br />
No momento em que os princípios da proprieda<strong>de</strong> privada e da livre iniciativa – baluartes<br />
sem cujo apoio as classes conservadoras <strong>de</strong>ixariam pura e simplesmente <strong>de</strong> existir, tragadas pelo<br />
comunismo – estão sendo postos em xeque pela Constituinte, o que mobiliza esse pon<strong>de</strong>rável setor<br />
do comércio é o prejuízo que terá, posto que esses pequenos empresários não têm suas lojas<br />
<strong>de</strong>vidamente estruturadas para esse atendimento dominical (“O Estado <strong>de</strong> S. Paulo”, 25-4-87). E<br />
para a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> suas pequenas vantagens pessoais e imediatistas, nem sequer aduzem que a medida<br />
proposta é transgressora do 3 º Mandamento da Lei <strong>de</strong> Deus.<br />
No IV Congresso Nacional que as Associações Comerciais realizaram em Brasília, em abril<br />
último, foi aprovado um documento final contendo uma firme <strong>de</strong>fesa dos princípios da livre<br />
iniciativa, em contraposição com a intervenção estatal na economia (“Folha <strong>de</strong> S. Paulo”, 26-4-87).<br />
Atitu<strong>de</strong> muito louvável se tivesse sido fundamentada numa argumentação doutrinária sólida e<br />
completa, dando também o <strong>de</strong>vido realce ao princípio da proprieda<strong>de</strong> privada, e sem nenhuma<br />
concessão ao agro-reformismo vigente. Infelizmente, não foi o que aconteceu. No Relatório Geral do<br />
Congresso, em seis laudas datilografadas, não aparece uma única vez a expressão proprieda<strong>de</strong><br />
privada, e toda ênfase é posta na liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciativa.<br />
É verda<strong>de</strong> que, no anteprojeto que o IV Congresso ofereceu como subsídio à elaboração do<br />
texto constitucional, a proprieda<strong>de</strong> privada dos meios <strong>de</strong> produção é apontada como um dos<br />
elementos da or<strong>de</strong>m econômica e social (art. B, inciso II). Entretanto, o mesmo Anteprojeto <strong>de</strong>clara<br />
que é da competência da União, após disposição <strong>de</strong> terras públicas inexploradas próprias, ...<br />
promover a <strong>de</strong>sapropriação <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> territorial rural, para fins <strong>de</strong> reforma agrária, mediante<br />
pagamento prévio <strong>de</strong> justa in<strong>de</strong>nização, em títulos da dívida pública, com cláusula <strong>de</strong> exata correção<br />
monetária, resgatáveis no prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos (art. C, § 5 º ).<br />
Como se vê, o Anteprojeto <strong>de</strong>lineado pelas Associações Comerciais propõe que a União<br />
comece a distribuição <strong>de</strong> terras pelas que pertencem aos Po<strong>de</strong>res públicos, mas já <strong>de</strong>ixa postas as<br />
pontas <strong>de</strong> trilho para uma Reforma Agrária no melhor estilo do Estatuto da Terra e do PNRA.<br />
Na Declaração <strong>de</strong> Princípios preparada pelas mais importantes entida<strong>de</strong>s patronais do<br />
Brasil, aglutinadas no Fórum <strong>de</strong> Empresários, realizado em São Paulo, “há advertências claras<br />
quanto às tentativas <strong>de</strong> intervenção do Governo na economia” (“O Globo”, 13-5-87). Porém,<br />
enquanto essas e outras advertências congêneres não <strong>de</strong>spertarem a solidarieda<strong>de</strong> real mas algum<br />
tanto adormecida, da maioria da população – mediante uma ofensiva publicitária em gran<strong>de</strong> estilo –<br />
as correntes estatizantes não encontrarão óbices a seu avanço. As classes conservadoras não têm<br />
empenhado nesse sentido todo o seu imenso potencial <strong>de</strong> propaganda.<br />
É expressivo <strong>de</strong>ssa falta <strong>de</strong> garra das classes empresarias o que se passou na Subcomissão<br />
da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária, por ocasião da votação da proposta do relator<br />
Oswaldo Lima Filho, <strong>de</strong> cunho marcadamente socialista. Os Constituintes conservadores se batiam<br />
pelo Substitutivo do <strong>de</strong>putado Rosa Prata, <strong>de</strong> tônica claramente conciliatória. Segundo seu autor, ele<br />
“<strong>de</strong>sradicalizava” o <strong>de</strong>bate sobre a reforma agrária (cfr. “O Globo”, 21-5-87). Na realida<strong>de</strong>, se bem<br />
que o Substitutivo eliminasse a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> área máxima dos imóveis rurais, bem como a posse<br />
automática, pela União, dos imóveis <strong>de</strong>cretados <strong>de</strong> interesse para a Reforma Agrária, fazia concessões<br />
ao agro-reformismo, mantendo “os mesmos dispositivos que tratam da função social da proprieda<strong>de</strong><br />
contidos no Estatuto da Terra”, e criando a figura da “proprieda<strong>de</strong> territorial rural improdutiva”<br />
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