1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
9 . Os candidatos foram cautelosos sobre os temas-chave da Constituinte<br />
Sobre quase todos os gran<strong>de</strong>s temas-chave face aos quais era iniludível <strong>de</strong>finir-se a<br />
Constituinte, especialmente em se tratando <strong>de</strong> matérias sócio-econômicas, a atitu<strong>de</strong> da generalida<strong>de</strong><br />
dos candidatos foi cautelosa, quando não esquiva, o que contribuiu para acentuar ainda mais o caráter<br />
a-i<strong>de</strong>ológico das eleições.<br />
Acerca <strong>de</strong>sses temas, como a tríplice reforma – agrária, urbana e empresarial – da qual tanto<br />
e tanto cuidaram os mass media <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito antes da abertura da campanha pré-eleitoral e, <strong>de</strong>pois,<br />
ao longo <strong>de</strong>sta – era indispensável que os candidatos se afirmassem pró ou contra <strong>de</strong> modo claro e<br />
corajoso. A<strong>de</strong>mais, teria sido indispensável que bom número <strong>de</strong>les tivesse utilizado largamente a<br />
televisão, o rádio e a imprensa, para expor com argumentação vigorosa e convincente, a respectiva<br />
posição. Debates <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> fôlego, entre os representantes mais qualificados <strong>de</strong> uma e outra posição,<br />
teriam concorrido para dar ao tema a dramaticida<strong>de</strong> e o calor indispensáveis à difusão dos argumentos<br />
<strong>de</strong> um e <strong>de</strong> outro lado. Slogans expressivos ainda po<strong>de</strong>riam ter enriquecido até seu termo final a<br />
controvérsia.<br />
Ora, quase nada ou nada disto se viu. Os candidatos freqüentemente se omitiram <strong>de</strong> tomar<br />
posição perante tais temas. Quando chegaram a tomar posição, o fizeram muitas vezes inibidos pelo<br />
medo e pelo oportunismo. E, quanto a exposições e <strong>de</strong>bates <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> envergadura, indicando <strong>de</strong><br />
parte dos candidatos lógica, erudição ou até mesmo cultura, pouco, muito pouco ou nada, houve,<br />
conforme acima já foi afirmado.<br />
Notou-o com perspicácia o então presi<strong>de</strong>nte do senado, José Fragelli, conforme noticia o<br />
“Correio Brasiliense”(19-11-86): Na campanha eleitoral não foram discutidos temas relacionados<br />
com as reformas sociais, segundo advertiu Fragelli. Os <strong>de</strong>fensores da reforma agrária não a<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram em praça pública, pelos mesmos motivos que os seus adversários não a combateram –<br />
porque não queriam per<strong>de</strong>r votos.<br />
Nada disso impediu um resultado surpreen<strong>de</strong>nte. As urnas <strong>de</strong>monstraram que o PCB, o PC<br />
do B, e outras correntes ou agrupamentos políticos da chamada “esquerda ortodoxa”, tinham<br />
eleitorado muito menor do que certa publicida<strong>de</strong> fez crer à gran<strong>de</strong> maioria dos candidatos como<br />
também ao público em geral. Em conseqüência do mito assim criado, o conjunto dos poucos e fracos<br />
pronunciamentos feitos pelos candidatos durante a propaganda eleitoral foi muito mais esquerdista<br />
do que o resultado das votações provou serem os eleitores.<br />
10 . Propaganda-Show<br />
Ao vazio das idéias levadas ao público pela propaganda eleitoral se tentou remediar com a<br />
propaganda-show, na qual não faltaram sequer aspectos francamente circenses.<br />
Típico <strong>de</strong>ssa propaganda-show, que se tornou moda por todo o Brasil, é o comício <strong>de</strong><br />
encerramento da campanha do candidato a governador vitorioso em Pernambuco, assim <strong>de</strong>scrito pelo<br />
“Jornal do Brasil” (27-10-86):<br />
Recife – Cerca <strong>de</strong> 80 mil pessoas aplaudiram ... Miguel Arraes, que recebeu durante um dos<br />
maiores shows-comícios do estado o apoio <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 20 artistas <strong>de</strong> renome nacional, entre atores,<br />
cantores e cineastas. ...<br />
Na festa <strong>de</strong> Arraes quase não houve espaço para discursos. ...<br />
O ator Mário Lago recitou três quadras e pediu para que o povo repetisse, verso a verso,<br />
uma proclamação na qual pe<strong>de</strong> voto para Arraes, ‘porque Pernambuco merece’. Depois <strong>de</strong>le<br />
alternaram-se atores, cantores e os integrantes da chapa majoritária do PMDB. Teca Calazans<br />
cantou, acompanhada pela multidão, o hino da campanha – uma paródia <strong>de</strong> Chico Buarque para a<br />
música ‘Tou voltando’, <strong>de</strong> Maurício Tapajós. ...<br />
Durante os discursos políticos, quem mais falou foi o candidato Miguel Arraes, não indo,<br />
entretanto além dos cinco minutos.<br />
43