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1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país

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Não se trata aqui <strong>de</strong> um privilégio fundado em mero preconceito, é bom insistir, mas <strong>de</strong><br />

conseqüência natural dos princípios cristãos sobre a matéria, consagrados não só pelo ensinamento<br />

da Igreja como pela tradição milenar da civilização cristã.<br />

5 . Caminho livre para o aborto<br />

O art. 256, § 4 º , do Substitutivo Cabral 2 prescreve: “É garantido a homens e mulheres o<br />

direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar livremente o número <strong>de</strong> seus filhos e o planejamento familiar, vedado todo<br />

tipo <strong>de</strong> prática coercitiva por parte do Po<strong>de</strong>r Público e <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s privadas”.<br />

Tais são as interferências que po<strong>de</strong>m ser produzidas para ser garantido, por meio do Po<strong>de</strong>r<br />

Público, “a homens e mulheres o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar livremente o número <strong>de</strong> seus filhos”, que<br />

isso eqüivale a abrir caminho para o aborto, aten<strong>de</strong>ndo às conveniências do casal 46 .<br />

Por outro lado, que é uma “prática coercitiva”?<br />

O Novo Dicionário da Língua Portuguesa, <strong>de</strong> Cândido <strong>de</strong> Figueiredo, registra, nos verbetes,<br />

coercitivo ou coercivo, “que coage. Que reprime; que impõe pena”; no verbete coerção, “ato <strong>de</strong><br />

coagir”; e no verbete coagir, “constranger, forçar”.<br />

O homônimo dicionário <strong>de</strong> Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda Ferreira registra, nos verbetes<br />

Coercitivo ou coercivo, “que po<strong>de</strong> exercer coerção”; no verbete coerção, “1) Ato <strong>de</strong> coagir; coação.<br />

2) Repressão, coibição. 3) Jur. A força que emana da soberania do Estado e é capaz <strong>de</strong> impor o<br />

respeito à norma legal”. E no verbete coagir “Constranger; forçar: ‘E se para o rei abdicar for mister<br />

coagi-lo, faça-se’ (Oliveira Martins, Portugal Contemporâneo, p. XXII); coagir os fracos; coagiramno<br />

a <strong>de</strong>mitir-se do cargo”.<br />

Como se vê, o substantivo coerção parece comportar dois sentidos cabíveis. Um é a ação<br />

pela qual se constrange alguém a fazer algo que não quer. Outro é o ato pelo qual se impe<strong>de</strong> alguém<br />

<strong>de</strong> fazer algo que <strong>de</strong>seja.<br />

Isto posto, exerceria uma ação “coercitiva” o pregador ou o diretor espiritual que afirmasse<br />

ser obrigação <strong>de</strong> consciência, para o católico, respeitar o curso normal da gestação e do nascimento?<br />

No segundo sentido, proce<strong>de</strong>ria <strong>de</strong> modo “coercitivo” o pregador ou o diretor espiritual que<br />

ameaçasse com as penas do inferno o pai ou a mãe que violasse o curso normal da gestação e do<br />

nascimento?<br />

Ou, ainda, exerceria ação “coercitiva” o hospital católico que recusasse sua colaboração para<br />

que tais violações fossem praticadas em seus recintos por médicos <strong>de</strong>les?<br />

Além da óbvia importância <strong>de</strong>ssas questões, que a ambigüida<strong>de</strong> do texto do Substitutivo<br />

Cabral 2 <strong>de</strong>ixa sem solução, cumpre notar que o art. 256, § 4 º , contém em embrião a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

uma profunda crise entre a Igreja e o Estado. Pois a prática <strong>de</strong> tais “coerções” faz parte do ministério<br />

da Igreja, que a elas não po<strong>de</strong>rá renunciar até a consumação dos séculos.<br />

De outro lado, se se enten<strong>de</strong>r que o art. 256, § 4 º , proíbe tais “coerções”, ele viola gravemente<br />

a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consciência dos católicos, pois estes têm o direito <strong>de</strong> ser instruídos pela Santa Igreja<br />

sobre todos os preceitos morais <strong>de</strong> que ela é Mestra.<br />

6 . Caminho livre para a contracepção<br />

O mesmo art. 256, § 4 º , garante “a homens e mulheres o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar livremente ...<br />

o planejamento familiar”. Esta disposição – excetuados aqueles modos <strong>de</strong> conduta face ao processo<br />

46<br />

Esse perigo <strong>de</strong> uma eventual legalização do aborto, por máxima constitucional, teria sido ainda maior se<br />

houvesse prevalecido o disposto no art. 12, I, “a”, do <strong>Projeto</strong> Cabral, o qual rezava assim: “Adquire-se a condição <strong>de</strong><br />

sujeito <strong>de</strong> direitos pelo nascimento com vida”. Se esse dispositivo ainda vier a ser aprovado, em fase posterior, pela<br />

Constituinte, estará aberta mais uma porta para a prática do homicídio na fase pré-natal, uma vez que o nascituro ainda<br />

não seria “sujeito <strong>de</strong> direitos”.<br />

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