1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país
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todas muito importantes não só para a boa formação moral do católico mas também para o a<strong>de</strong>quado<br />
relacionamento entre os homens.<br />
Um exemplo: se alguém não tem como pagar moradia, e outrem tem casas <strong>de</strong> sobra, o<br />
segundo <strong>de</strong>ve franquear gratuitamente alguma habitação ao necessitado; ou se alguém não tem on<strong>de</strong><br />
plantar, e outrem tem terras <strong>de</strong> sobra, este último <strong>de</strong>ve facilitar as terras necessárias ao primeiro.<br />
“Franquear”, “facilitar”? Que querem dizer exatamente esse vocábulos? Emprestar gratuitamente<br />
enquanto dure o tempo <strong>de</strong> carência? Ou dar? Sempre quando a situação <strong>de</strong> B possa ser remediada<br />
com um simples empréstimo, exigir a doação constitui autêntico abuso. Um pouco como se,<br />
precisando <strong>de</strong> pão um indigente, o pa<strong>de</strong>iro lhe tivesse que dar a padaria, e não apenas o pão. A<strong>de</strong>mais,<br />
po<strong>de</strong>ndo o indigente que consiga abastança reembolsar quem lhe ce<strong>de</strong>u o uso gratuito, ou a<br />
proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> algum bem, <strong>de</strong>ve fazê-lo. Em qualquer caso, o beneficiário fica vinculado ao benfeitor<br />
pelos laços do respeito e da gratidão. Deve-lhe homenagem e assistência.<br />
11 . Como a “esquerda católica” envenena o problema<br />
Bem entendido, assim não pensa a “esquerda católica”. O carente <strong>de</strong>ve ver em todo abastado<br />
um ladrão, o qual está in<strong>de</strong>vidamente <strong>de</strong> posse <strong>de</strong> algo daquilo a que o carente tem direito estrito.<br />
Pelo que ao carente toca o direito <strong>de</strong> avançar pura e simplesmente – <strong>de</strong> porrete ou faca na mão, se for<br />
preciso – contra o abastado, e arrancar-lhe o necessário. Quem julga da quantida<strong>de</strong> e da qualida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sse necessário? É o carente. Tanto mais que ao lado <strong>de</strong>le está o berreiro <strong>de</strong>magógico da imprensa<br />
esquerdista e, muito freqüentemente, o apoio ainda mais <strong>de</strong>magógico do Bispo local. Berreiro e apoio<br />
sem os quais o carente jamais ousaria empunhar a faca, ou o porrete...<br />
Do papel da carida<strong>de</strong> cristã para resolver pacificamente situações <strong>de</strong>ssa natureza, a “esquerda<br />
católica” nada diz. Ou quase nada. Da justiça comutativa, pela qual alguém <strong>de</strong>ve pagar o que<br />
comprou, ou fornecer o que ven<strong>de</strong>u, e da distinção entre esta justiça e a distributiva, i<strong>de</strong>m.<br />
Dos <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> gratidão, <strong>de</strong> homenagem e <strong>de</strong> assistência do beneficiário, menos ainda. Ela<br />
preten<strong>de</strong> fulminar todas essas nobres obrigações com uma só injúria: “cheiram a Ida<strong>de</strong> Média”.<br />
E, munida <strong>de</strong> uma noção tão empobrecida do que seja a justiça social, a “esquerda católica”<br />
investe contra toda a or<strong>de</strong>m sócio-econômica vigente. Com gáudio, é bem claro, do PCB, do PC do<br />
B, e <strong>de</strong> todo gênero <strong>de</strong> socialistas, utopistas ou terroristas.<br />
A função social, assim simplística e <strong>de</strong>magogicamente entendida, promete liberda<strong>de</strong> e<br />
igualda<strong>de</strong>. Porém cria uma nova classe <strong>de</strong> mujiques, <strong>de</strong> escravos no estilo da Rússia comunista.<br />
E volta à memória a frase <strong>de</strong> Madame Roland: “Função social, função social, <strong>de</strong> quantas<br />
injustiças e até <strong>de</strong> quantos crimes vai sendo ameaçado, em teu nome, todo o Brasil” – tem-se vonta<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> exclamar!<br />
12 . Todo o corpo social tem funções a cumprir em favor do bem comum<br />
Ora, a or<strong>de</strong>m social católica não se obtém apenas mediante uma transferência <strong>de</strong> bens das<br />
classes abastadas ou ricas para as carentes. Pois o direito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> ser reduzido a mera<br />
função social 77 . Nem a função social é mero encargo do proprietário e da proprieda<strong>de</strong>.<br />
Como nos organismos vivos, cada elemento do corpo social tem uma missão – e portanto<br />
uma função – para o bem do conjunto. E assim o trabalho também tem indispensáveis funções a<br />
cumprir em favor do bem comum. Se, por exemplo, todos os diretores, médicos, enfermeiros,<br />
funcionários administrativos e encarregados <strong>de</strong> limpeza <strong>de</strong> todos os hospitais <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong><br />
uma região se <strong>de</strong>clararem simultaneamente em greve, violam gravemente a função social do trabalho.<br />
77<br />
É o que <strong>de</strong>ixou bem claro Pio XII, na já citada Radiomensagem <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1952, dirigida ao<br />
Katholikentag <strong>de</strong> Viena: “O direito do indivíduo e da família à proprieda<strong>de</strong> é uma conseqüência imediata da essência da<br />
pessoa, um direito da dignida<strong>de</strong> pessoal, um direito vinculado, é verda<strong>de</strong>, por <strong>de</strong>veres sociais; não é porém meramente<br />
uma função social” (Discorsi e Radiomessaggi, vol. XIV, p. 314).<br />
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