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1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país

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Como explicável contrapeso dos fanatismos totalitários, <strong>de</strong>spóticos e cruéis <strong>de</strong> direita e <strong>de</strong><br />

esquerda, a opinião pública do Brasil como, aliás, a <strong>de</strong> vários outros países do Oci<strong>de</strong>nte, foi tomada,<br />

<strong>de</strong>pois da II Guerra Mundial, por um centrismo que po<strong>de</strong> ser qualificado <strong>de</strong>sassombradamente <strong>de</strong><br />

extremado e obsessivo.<br />

Durante a II Guerra Mundial, o mundo sofreu os efeitos dramáticos do antagonismo, aliás<br />

mais aparente do que real, entre o regime comunista e o nazi-fascista.<br />

Seria excessivo afirmar que esse antagonismo foi a causa única da terrível conflagração. Para<br />

a irrupção <strong>de</strong>sta concorreram muitas outras causas, <strong>de</strong> diversa natureza. Entretanto, é fora <strong>de</strong> dúvida<br />

que esse antagonismo foi uma das causas pon<strong>de</strong>ráveis da Segunda Guerra, e marcou a fundo muitos<br />

<strong>de</strong> seus aspectos.<br />

A partir <strong>de</strong>ste fato, certa publicida<strong>de</strong> começou a dar a enten<strong>de</strong>r que não só tal oposição <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ologias e <strong>de</strong> regimes era a principal ou a única causa da guerra, mas também que esta última<br />

eclodira, não tanto pela natureza mesma das i<strong>de</strong>ologias em confronto, como sobretudo pelo grau <strong>de</strong><br />

fanatismo com que ambas as correntes <strong>de</strong> extremados viviam a mútua polêmica.<br />

Desta perspectiva, sobre a qual a publicida<strong>de</strong> acabou por insistir ad nauseam, parecia<br />

emergir aos olhos <strong>de</strong> todos a falsa noção <strong>de</strong> que todas as doutrinas – quaisquer que fossem – levadas<br />

com lógica inflexível às suas últimas conseqüências, conduzem à formação <strong>de</strong> antagonismos <strong>de</strong><br />

morte. Pelo que o mal não estaria tanto nas doutrinas antagônicas em si mesmas consi<strong>de</strong>radas, porém<br />

na lógica férrea e levada às últimas conseqüências dos a<strong>de</strong>ptos <strong>de</strong>ssas doutrinas.<br />

2 . Irrompe, assim, o fantasma do extremismo<br />

Nasceu assim, para o mundo, um novo fantasma: o extremismo, filho da inflexibilida<strong>de</strong> da<br />

lógica. Como se pu<strong>de</strong>sse existir uma lógica ... flexível! Uma matemática flexível, por exemplo...<br />

A evolução <strong>de</strong>ssa peculiar “ótica” – que, como se vê, envolve na sua nebulosida<strong>de</strong><br />

complexos elementos filosóficos, mais especificamente criteriológicos, morais, políticos, históricos,<br />

e também religiosos – não ficou aí.<br />

Qualificado esse “extremismo” como gran<strong>de</strong> causa da II Guerra, e agravada a nocivida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

qualquer guerra com a explosão das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, o fantasma do<br />

extremismo acabou por tomar o vulto do maior perigo que ameaça o mundo contemporâneo. Mais<br />

ainda, o maior perigo <strong>de</strong> todos os tempos.<br />

Esse perigo não cessou com a <strong>de</strong>rrota do nazi-fascismo. Pois, na estacada da luta contra o<br />

comunismo, surgiu, com o término da II Guerra, o capitalismo. E os dois mundos – comunista e<br />

capitalista – estariam prestes a confrontar-se, caso os “extremistas” <strong>de</strong> uma e outra corrente<br />

assumissem a direção, respectivamente da Rússia e dos Estados Unidos. Daí <strong>de</strong>correria, em virtu<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> mais um lance <strong>de</strong>sse processo evolutivo, que a repressão dos “extremistas”, <strong>de</strong> um e <strong>de</strong> outro lado,<br />

seria condição fundamental e clamorosamente necessária, da sobrevivência do gênero humano.<br />

3 . Paralelamente, forja-se a figura sedutora do mo<strong>de</strong>rantismo centrista<br />

Mas, ao mesmo tempo que assim irrompia o fantasma do extremismo, a publicida<strong>de</strong> forjava<br />

a figura sedutora do “anjo” laico do mo<strong>de</strong>rantismo centrista.<br />

O nome tutelar <strong>de</strong> quantos lutam contra o extremismo passou a ser então o mo<strong>de</strong>rantismo.<br />

Ter opiniões mo<strong>de</strong>radas que, ou não proce<strong>de</strong>m <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s iniciais evi<strong>de</strong>ntes e incontestáveis, ou não<br />

levam às últimas conseqüências essas verda<strong>de</strong>s, e assim se mostram incessantemente abertas a<br />

combinações contraditórias com os opositores: eis o mo<strong>de</strong>rantismo centrista que ten<strong>de</strong> a dominar<br />

cada vez mais o mundo mo<strong>de</strong>rno, e a plasmá-lo como se fosse ele a verda<strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nte e básica sobre<br />

a qual se <strong>de</strong>veria construir a socieda<strong>de</strong> pacifista do futuro.<br />

Quanto mais o mo<strong>de</strong>rantismo seja coerente no chegar às últimas conseqüências <strong>de</strong> si próprio,<br />

e meticuloso na repressão até das últimas e mais miúdas conseqüências do extremismo, tanto mais<br />

ele protegerá o gênero humano contra a hecatombe final.<br />

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