1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país
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Assim como a Revolução Francesa eliminou todas as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s que pô<strong>de</strong>, reduziu<br />
muitas das que não conseguiu eliminar e ten<strong>de</strong>u constantemente para a igualda<strong>de</strong> completa, assim<br />
também a influência do espírito igualitário <strong>de</strong> 1789 se fez sentir no <strong>Projeto</strong> Cabral, no sentido <strong>de</strong><br />
eliminar ou reduzir quanto possível certas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, essenciais ao mundo <strong>de</strong> aquém-cortina-<strong>de</strong>ferro.<br />
E não é difícil perceber que esse sopro igualitário continuamente bafejado pelo PCB e pelo PC<br />
do B, é animado pela esperança <strong>de</strong> que a aprovação do <strong>Projeto</strong> seja marco significativo para o<br />
estabelecimento <strong>de</strong> uma igualda<strong>de</strong> completa, da “liberda<strong>de</strong>” carcerária e da fraternida<strong>de</strong> feroz<br />
implantada na Rússia – a partir <strong>de</strong> 1917 por Lenin.<br />
Um tal sopro, consciente em uns, subconsciente em outros, em todo caso presente no espírito<br />
<strong>de</strong> todos a quem ele impulsiona, serve <strong>de</strong> explicação para muito do que a Constituinte está chamada<br />
a aceitar ou rejeitar na fase final <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates, emenda e votações em que vai penetrar.<br />
É tão saliente essa inspiração, que em numerosos comentários aco<strong>de</strong> naturalmente a<br />
comparação explícita ou implícita, transparente ou velada, entre o que se passa na atual Constituinte<br />
e a atmosfera i<strong>de</strong>ológica da Revolução Francesa, ou, <strong>de</strong> modo mais genérico, com numerosos<br />
movimentos revolucionários do século passado ou mesmo <strong>de</strong>ste:<br />
“Em todo o ano passado e o começo <strong>de</strong>ste, ‘era como se estivéssemos em 1789, discutindo<br />
o abecê das coisas mais elementares’” (Alexandre Costa, “O Estado <strong>de</strong> S. Paulo”, 16-4-87), comenta<br />
o Ministro da Justiça, Paulo Brossard.<br />
“A Constituinte que hoje se instala elegeu-se, no entanto, sob uma atmosfera social<br />
impregnada <strong>de</strong> partículas i<strong>de</strong>ológicas e políticas mais propícias aos empreendimentos utópicos. ...<br />
“A utopia e a <strong>de</strong>magogia, em doses elevadas, comprovam a existência <strong>de</strong> uma excitação<br />
cívica mal canalizada. Uma constituição não se impregna <strong>de</strong> sentido duradouro apenas porque se<br />
compromete com o horizonte utópico”(“Jornal do Brasil”, 1 º -2-87).<br />
“Ela [a Assembléia Constituinte] não diminui conflitos: dilata-os, transforma-os em<br />
impasse e po<strong>de</strong> levá-los ao paroxismo, com o sacrifício da or<strong>de</strong>m e, em seguida, da liberda<strong>de</strong>. Não<br />
foi assim com o advento do Terror, a guilhotina funcionando a plena carga e o Comitê <strong>de</strong> Salvação<br />
Pública <strong>de</strong>cidindo sobre a honra, o patrimônio e a vida <strong>de</strong> todos os franceses?” (“O Estado <strong>de</strong> S.<br />
Paulo”, 17-2-87).<br />
“Enquanto os constituintes rascunham normas do futuro regimento em Brasília, sobra<br />
tempo para um pulinho à França <strong>de</strong> 1789. Não se po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r a instalação da assembléia dos<br />
Estados Gerais no dia 4 <strong>de</strong> junho. Durante cinco semanas, Versalhes foi igualzinha a Brasília:<br />
conversa fiada. A nobreza e o clero puxavam com elegância para um lado, os burgueses<br />
estabanadamente para o outro. ... O impasse se manteve arrogante até o dia 17. Aí então foi posta<br />
em votação a diabólica proposta para o Terceiro se separar dos outros dois e <strong>de</strong>liberar com<br />
exclusivida<strong>de</strong> como assembléia constituinte. Um achado, a idéia do padre (Abbé Sieyès). Dirigiramse<br />
em bando, barulhento mas <strong>de</strong>terminado, para a sala do jogo da péla, que ficava perto ... Aí o<br />
pessoal do Terceiro fez o juramento <strong>de</strong> não se separar antes <strong>de</strong> dar à França uma constituição. O<br />
golpe preventivo caiu no vazio, o clero e a nobreza caíram fora e o Terceiro Estado caiu em si. Ainda<br />
não era a revolução, mas – sem dúvida – já era a constituição” (Wilson Figueiredo, “Jornal do<br />
Brasil”, 8-2-87).<br />
“Brincou-se mais <strong>de</strong> revolução, ora na moldura francesa <strong>de</strong> 1789, ora no padrão equívoco<br />
da Rússia <strong>de</strong> 1917, mas sem consi<strong>de</strong>rar o Brasil – nas suas necessida<strong>de</strong>s e nas suas peculiarida<strong>de</strong>s<br />
sociais e históricas”(“Jornal do Brasil”, 2-7-87).<br />
Senador Afonso Arinos: “Estamos atravessando hoje no Brasil uma fase que a Europa<br />
atravessou há cem anos. A Revolução <strong>de</strong> 1848 42 , na França, foi uma revolução social típica. Foi<br />
42<br />
Em 1830, uma Revolução impregnada fortemente pelo espírito <strong>de</strong> 1789 <strong>de</strong>pusera Carlos X. Essa Revolução<br />
elevou ao trono o Duque <strong>de</strong> Orleans, filho do famoso príncipe revolucionário, “Philippe-Égalité”. Subiu ele ao trono<br />
com preterição dos direitos do her<strong>de</strong>iro legítimo, pertencente a linha primogênita, Henrique, Duque <strong>de</strong> Bour<strong>de</strong>aux e <strong>de</strong>pois<br />
Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Chambord. Alçado ao trono por uma Revolução liberal, o Duque <strong>de</strong> Orleans tomou o nome <strong>de</strong> Luís Felipe I.<br />
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