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1987 - Projeto de Constituiçao angustia o país

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Ninguém está prestando atenção à Constituição – <strong>de</strong>sabafou o <strong>de</strong>putado do Triângulo, no<br />

exercício da presidência da tumultuada seção estadual do PMDB. ...<br />

Atendo a mais <strong>de</strong> 50 telefonemas por dia, <strong>de</strong> eleitores do interior. Falo com centenas <strong>de</strong><br />

pessoas. Todos estão preocupados com a crise econômica e com a confusão política. Pela<br />

Constituinte, não há quem se interesse. A crise liquidou com a Constituinte (Villas-Bôas Corrêa,<br />

“Jornal do Brasil”, 15-5-87).<br />

Depois do farto noticiário que nossos mass media têm fornecido ao público <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />

instalação da Constituinte em 1 º <strong>de</strong> fevereiro, era <strong>de</strong> esperar que essa situação melhorasse. Pesquisas<br />

recentes do Gallup e do Ibope divergem, entretanto, a esse respeito, segundo notícia do “Jornal do<br />

Brasil” (13-9-87): Há profundo <strong>de</strong>sprezo nas ruas pelo que acontece na Constituinte. Os dados do<br />

Gallup a esse respeito ainda são otimistas: 64% dos brasileiros sabem o que é Constituinte, embora<br />

apenas 18% acompanhem efetivamente o seu trabalho ‘com muito interesse’. Mas os do Ibope são<br />

<strong>de</strong>molidores para quem se imagina porta-voz da vonta<strong>de</strong> popular. Des<strong>de</strong> 1985, quando foi feito o<br />

primeiro levantamento, até agosto <strong>de</strong> <strong>1987</strong>, data do último, o grau do conhecimento dos brasileiros<br />

sobre a Constituinte praticamente não sofreu alteração, segundo o Ibope: 6% ‘sabem bem’ do que<br />

se trata, 25% ‘sabem mais ou menos’ e 69% ‘não sabem nada’.<br />

2 . Constituintes sem compromisso com o eleitorado<br />

Uma população pouco i<strong>de</strong>ologizada é fruto <strong>de</strong> – e ao mesmo tempo tem como conseqüência<br />

– uma organização político-partidária vazia <strong>de</strong> idéias. Esta situação projeta seus efeitos sobre os<br />

Constituintes, que não se sentem vinculados por qualquer espécie <strong>de</strong> compromisso com seus eleitores.<br />

O senador Fernando Henrique Cardoso exprime essa situação numa fórmula lapidar: Eleição<br />

é uma coisa, comportamento parlamentar é outra. O voto, no Brasil, não carrega uma idéia (Luís<br />

Carlos Lanzetta, “O Globo”, 1 º -2-87).<br />

Como imaginar que a Carta Magna que elaborem os Constituintes assim eleitos tenha muito<br />

alto teor <strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática?<br />

Sob o título inquietante O início da aventura, José Paulo Cavalcanti Filho escreve <strong>de</strong> Recife<br />

para a “Folha <strong>de</strong> S. Paulo” (1 º -2-87): O Brasil começa, hoje, a aventura <strong>de</strong> uma Assembléia Nacional<br />

Constituinte que chega fora <strong>de</strong> hora, quando toda a gente está preocupada com a ameaça do Cruzado<br />

2 e a opressão da dívida externa, e já não com a reor<strong>de</strong>nação institucional do país. O Congresso é<br />

agora composto por <strong>de</strong>putados e senadores eleitos em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> campanha para o governo dos<br />

Estados on<strong>de</strong> se discutiu quase tudo, mas quase nada se disse sobre a nova Constituição; e, nessa<br />

equação, o nível <strong>de</strong> ignorância dos eleitores em relação à posição i<strong>de</strong>ológica dos eleitos é<br />

proporcional ao <strong>de</strong>scompromisso <strong>de</strong>stes em relação àqueles. Os partidos políticos não forma capazes<br />

<strong>de</strong> produzir projetos específicos que corporificassem um conjunto <strong>de</strong> propostas coerentes, que se<br />

prestasse a ser uma referência para a nova Constituição; ou não mostraram interesse nisso.<br />

O jornalista Luiz Carlos Lisboa aponta o que essa situação tem <strong>de</strong> irregular: As agremiações<br />

partidárias <strong>de</strong>viam informar claramente aos que votam as idéias básicas daqueles em quem estão<br />

votando. Em outras palavras, candidatos <strong>de</strong>viam pertencer a partidos com projetos <strong>de</strong>finidos e<br />

imediatamente i<strong>de</strong>ntificáveis. É o mínimo que se po<strong>de</strong> esperar. ... Esse requisito elementar não é<br />

atendido, entre nós. A maioria absoluta do eleitorado ... não conhece bem o indivíduo que está<br />

elegendo para um cargo público, e nada sabe sobre a agremiação que abriga esse candidato. O que<br />

não é <strong>de</strong> admirar, porque a própria agremiação nada sabe <strong>de</strong> si mesma, visto que é um oco total, a<br />

menos que se trate dos partidos comunistas e, até certo ponto, <strong>de</strong> um partido como o PT. Votar no<br />

PMDB, ou no PFL, significa algumas coisa como escolher cinco números na aposta semanal da loto:<br />

- puro capricho, mero acaso. O programa? De que vale o programa partidário? ... Ninguém sabe,<br />

no Brasil, o que se escon<strong>de</strong> atrás <strong>de</strong> siglas como a do PMDB, a do PFL, a do PDT, a do PTB, que<br />

não sejam frases <strong>de</strong> efeito e o discurso tradicionalmente vazio da parlapatice pública nacional (“O<br />

Estado <strong>de</strong> S. Paulo”, 4-7-87).<br />

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