Edição Nº 19 - Uneb
Edição Nº 19 - Uneb
Edição Nº 19 - Uneb
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Léa Austrelina Ferreira Santos<br />
origem africana em dois planos: mais especificamente,<br />
na afirmação existencial dos jovens<br />
que estão envolvidos na elaboração da perspectiva<br />
pedagógica do Odemodé e num plano<br />
mais abrangente, em analogia, o da afirmação<br />
das identidades culturais de grande parte da<br />
população infanto-juvenil afro-descendente.<br />
Essa música, além de simbolizar a elaboração<br />
de mundo ligada à identidades dos jovens, fornece<br />
uma referência para todo um segmento<br />
populacional de afirmação da diversidade cultural<br />
em nosso país.<br />
A sanção da referida Lei constitui-se em um<br />
fato importante na história da legislação educacional<br />
brasileira, visto que a historiografia oficial<br />
exerce o silêncio sobre o processo civilizatório<br />
africano no Brasil; entretanto, é necessário refletir<br />
sobre quais são os referenciais contidos para<br />
a sua proposição. A partir de que referências é<br />
que se propõe o ensino de história sobre afrobrasileiros?<br />
Como evitar as visões etnocêntricas<br />
e as imposições de valores neocoloniais e imperialistas<br />
dominantes no ensino da História em<br />
nosso contexto?<br />
2. A Lei 10.639/03: tensões e obstáculos<br />
teórico-epistemológicos na<br />
concepção de perspectivas pluriculturais<br />
de Educação<br />
A Lei 10.639 foi sancionada pelo Presidente<br />
da República, Luís Inácio Lula da Silva, em 9<br />
de janeiro de 2003, e acrescenta dois artigos à<br />
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação<br />
Nacional, número 9.394, de <strong>19</strong>96. É importante<br />
ressaltar o caráter de “novidade” contido nela,<br />
o que significa que as análises e reflexões são<br />
muito recentes, e o seu conteúdo tem causado<br />
grandes expectativas na comunidade docente<br />
brasileira. As reflexões contidas aqui têm como<br />
característica o fomento de discussões, em vez<br />
da apresentação de propostas fechadas e conclusivas.<br />
A principal mudança estabelecida pela Lei<br />
é que ela torna obrigatório o ensino sobre História<br />
e Cultura Afro-brasileira no currículo oficial<br />
da rede de ensino e inclui como conteúdo<br />
programático:<br />
... o estudo sobre História da África e dos Africanos,<br />
a luta dos negros no Brasil, a cultura negra<br />
brasileira e o negro na formação da sociedade<br />
nacional resgatando a contribuição do povo<br />
negro nas áreas social, econômica e política<br />
pertinentes à História do Brasil. (Texto da Lei<br />
10.639/03 - Grifos meus)<br />
A Lei determina também que esses conteúdos<br />
serão ministrados em todo o currículo escolar,<br />
especialmente na área de Educação Artística,<br />
História e Literatura Brasileiras, e inclui<br />
o dia 20 de novembro como Dia Nacional da<br />
Consciência Negra no calendário escolar.<br />
Esta Lei contaria ainda com mais um inciso<br />
e um artigo que foram vetados 5 pela Presidência<br />
da República: o primeiro, o inciso 3, determinava<br />
que fossem dedicados, no ensino médio,<br />
10% do conteúdo programático anual ou<br />
semestral das disciplinas de História do Brasil<br />
e Educação Artística. Esse inciso foi vetado,<br />
pois iria de encontro à proposta da Constituição<br />
brasileira de <strong>19</strong>88, que impôs à legislação<br />
infraconstitucional o respeito às peculiaridades<br />
regionais e locais, o que teria sido contemplado<br />
no caput do artigo 26 da LDB que preceitua:<br />
Os currículos do ensino fundamental e médio<br />
devem ter uma base nacional comum, a ser<br />
complementada, em cada sistema de ensino e<br />
estabelecimento escolar, por uma parte diversificada,<br />
exigida pelas características regionais e<br />
locais da sociedade, da cultura, da economia e<br />
da clientela.<br />
Além disso, em outro artigo da Constituição,<br />
o 211, afirma-se como de interesse público a<br />
participação dos Estados e Municípios na elaboração<br />
dos currículos mínimos nacionais, preceito<br />
contemplado na LDB no artigo 9, inciso 4. Este<br />
seria também outro interesse público contrariado<br />
pelo inciso 3.<br />
Quanto ao artigo vetado, estabelecia que os<br />
cursos de capacitação para professores deveriam<br />
contar com a participação de entidades do<br />
movimento afro-brasileiro, das universidades e<br />
de outras instituições de pesquisa. Porém a LDB<br />
não disciplina e nem faz menção em nenhum dos<br />
5<br />
Vide Mensagem do Veto número 7, de 09/01/2003. Presidência<br />
da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos<br />
Jurídicos.<br />
Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 99-111, jan./jun., 2003<br />
101