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Edição Nº 19 - Uneb

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Jaci Maria Ferraz de Menezes<br />

condição de eleitor. Era necessário um tempo<br />

de preparação para o voto, como disse no discurso<br />

que excluía os analfabetos da qualificação<br />

de eleitor. Conhecendo, como conhecia, a<br />

condição de analfabetismo no Brasil e sabendo,<br />

com clareza quem eram os analfabetos, a<br />

sua exclusão era, ao mesmo tempo, a exclusão<br />

do pobre e do liberto – já que aos escravos era<br />

vedada a escolarização. O Pós-abolição demandava<br />

garantias da ordem. Em seu projeto, apresenta<br />

as razões pelas quais o Brasil estaria em<br />

melhores condições que todos os demais para<br />

fazer a sua abolição gradual, sem traumas. Para<br />

tanto, propõe a obrigação do trabalho e um<br />

qüinqüênio de domicílio forçado. “Só duas<br />

faculdades se recusam ao liberto: por cinco anos,<br />

residir em outro município; em qualquer tempo,<br />

a vagabundagem” (BARBOSA, <strong>19</strong>88, p.767).<br />

A finalidade destas cláusulas, para ele, seria<br />

educativa, formativa para a liberdade, “proscrevendo<br />

a liberdade da preguiça”. Aí se estabelece,<br />

ou melhor, se reforça – porque já existia<br />

essa legislação de repressão à vadiagem na Lei<br />

do Ventre Livre – o controle sobre o direito de<br />

ir e vir dos negros e o seu direito ao não trabalho.<br />

Em nenhum outro ponto do parecer ou do<br />

projeto fala da questão da educação ou da cidadania<br />

ativa; os libertos são libertos. Nenhuma<br />

proposta de educação em massa, apesar<br />

dos elogios à situação dos EEUU. Silêncio absoluto<br />

sobre o direito ao voto, tão claramente<br />

explicitado por Nabuco. Nada de Reforma da<br />

Agricultura, como propõe este último. A educação<br />

era para as crianças. Os adultos, se davam<br />

valor ao voto, buscariam por si próprios os<br />

meios de aprender a ler e a escrever para se<br />

tornarem eleitores. Os analfabetos já estavam<br />

excluídos da cidadania.<br />

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Em suma, para tornar-se cidadão, faltava<br />

ao ex-escravo o “batismo” da instrução – garantia<br />

da sua entrada na civilização letrada,<br />

escrita, ocidental, como também passaporte<br />

para a brasilidade. A intenção de excluir os<br />

analfabetos – bem como a consciência de<br />

quem eram eles – eram claras em Rui Barbosa.<br />

Tem também clareza da tarefa gigantesca<br />

que representava “batizar” a tantos pagãos da<br />

civilização – falara até em velocidade – celeridade<br />

de milésimos por anos. O que talvez não<br />

esperasse é que o modelo federalista e municipalista<br />

por ele mesmo apregoado como forma<br />

de organização do Estado brasileiro acabasse<br />

por protelar tanto a implantação do ensino<br />

obrigatório, durante toda a República Velha.<br />

A consciência da educação como direito<br />

de todos e dever do Estado só vai se tornar<br />

mais forte na década de 20 e, em especial, na<br />

década de 30. Só a partir daí o acesso à escola<br />

se vai dando mais maciçamente, mesmo<br />

assim com diferenças marcadas pelas diferenças<br />

regionais decorrentes da completa inexistência<br />

de uma ação equalizadora por parte do<br />

governo central.<br />

Os resultados da exclusão dos analfabetos<br />

do direito ao voto fizeram da Republica Velha<br />

uma Republica em que votavam uma pequena<br />

minoria. Em 1881, no ano da aprovação da Lei<br />

Saraiva, contrariamente aos cálculos de Rui<br />

Barbosa, votavam 145.296 pessoas, numa população<br />

de 11.973.000 – ou seja, 1,2% . Com<br />

a Proclamação da República, retirada a exigência<br />

do censo pecuniário, o número de eleitores<br />

continuou muito pequeno. Calcula-se que,<br />

em <strong>19</strong>08, o porcentagem de eleitores na população<br />

total era da ordem de 4%. Na Bahia,<br />

este percentual era de apenas 3,54%, segundo<br />

Mapa Estatístico elaborado no Governo de<br />

Araújo Pinho. Como o voto não era obrigatório,<br />

o número de votantes era ainda menor:<br />

calcula-se que, até <strong>19</strong>30, os votantes foram,<br />

em média, 2,6% da população total. Apenas<br />

em <strong>19</strong>34 as mulheres adquirem direito ao voto,<br />

caindo a idade mínima para 18 anos e tornando-se<br />

o voto secreto e obrigatório. Continuouse,<br />

no entanto, a excluir os analfabetos. Assim,<br />

o crescimento, daí em diante, do número<br />

de eleitores este condicionado ao crescimento<br />

da alfabetização na população adulta. Apenas<br />

em <strong>19</strong>85 se facultou o voto ao analfabeto.<br />

É o seguinte o crescimento do eleitorado no<br />

Brasil, entre 1881 e <strong>19</strong>82 (Tabela 1).<br />

Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. <strong>19</strong>-40, jan./jun., 2003<br />

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