Edição Nº 19 - Uneb
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Do monopólio da fala sobre educação à poesia mítica africano-brasileira<br />
se desdobra a prescrição una, linear e totalizante<br />
das políticas educacionais voltadas para a formação<br />
do sujeito produtor e consumidor.<br />
É surpreendente observar, nos constantes<br />
intercâmbios com educadores da África, Ásia,<br />
América Latina e Caribe 1 , todo um esforço em<br />
estabelecer estratégias de descolonização no<br />
âmbito das políticas educacionais.<br />
De fato, a efervescência das estratégias de<br />
descolonização tem sido a implosão do monopólio<br />
da fala 2 produtivista sobre educação, cujo<br />
entulho teórico-ideológico tende a recalcar as<br />
dinâmicas territoriais e comunalidades milenares<br />
que mapeiam o planeta.<br />
Estamos tendo o prazer de ver expandiremse<br />
contemporaneamente, iniciativas coletivas de<br />
educadores em todo o mundo, em torno da afirmação<br />
de uma nova e urgente abordagem sobre<br />
educação, cujo princípio inaugural é a dimensão<br />
ontológica da diversidade humana,<br />
marcada pela angustiante procura da compreensão<br />
sobre o estar no mundo, no universo, enfim,<br />
o processo dinâmico da existência.<br />
Estamos fundando uma concepção sobre<br />
educação capaz de acolher linguagens cuja<br />
matriz seja “... a criação emocional e poética<br />
dos povos que mobiliza e abre caminhos, pontes<br />
de aproximação entre comunidades diversas”<br />
(SANTOS, 2002, p.26).<br />
Esse é um dos desafios apresentado por este<br />
ensaio, contribuindo, de um lado, para a implosão<br />
do monopólio da fala etnocêntrica-evolucionista<br />
sobre a existência; e, do outro, promover e dar<br />
legitimidade à expansão sócio-existencial das<br />
diversidades culturais capaz de consagrar uma<br />
ética do futuro.<br />
No tocante à Educação, pretendemos explorar<br />
o universo complexo que constitui as diversidades<br />
culturais e delas realçar: as identidades<br />
profundas que marcam milenarmente<br />
formas de sociabilidade; cosmogonias, linguagens<br />
e valores transcendentais de distintos povos,<br />
suas dinâmicas territoriais, instituições, visão<br />
de mundo, patrimônios civilizatórios; elaborações<br />
emocionais – gênese de criatividade, importante<br />
legado para a humanidade, que inunda<br />
de poesia o existir.<br />
Nossas expectativas sobre as reflexões que<br />
fomentaremos é que elas constituam um espaço<br />
político-institucional que consagre um debate<br />
transdisciplinar, realçando a importância das<br />
tradições culturais características das sociedades<br />
contemporâneas; enfatize as formas de comunicação<br />
milenares utilizadas nas distintas<br />
territorialidades do planeta, os princípios cosmogônicos,<br />
as concepções filosóficas e expressões<br />
ético-estéticas ancoradas no patrimônio mítico<br />
que dá visibilidade e afirma toda à complexidade<br />
cultural necessária a expansão e à afirmação<br />
existencial da diversidade humana; (re)examine<br />
as novas tendências e perspectivas voltadas para<br />
a promoção dos direitos coletivos e identidades<br />
coletivas; ressalte a implosão das utopias dos<br />
Estados Modernos que, durante séculos, impôs<br />
o monopólio da fala sobre educação, recalcando<br />
distintos patrimônios civilizatórios; e, finalmente,<br />
recomende perspectivas educacionais que<br />
promovam o direito à alteridade.<br />
Uma observação fundamental: nossas vivências<br />
e inserção comunitária nos levam a assumir<br />
uma opção político-ideológica que se esforça<br />
para sair da superfície de analogias sobre a<br />
diversidade cultural, que tendem ao outro fragmentado,<br />
por meio de recortes teóricos em que<br />
a dinâmica de estruturação da alteridade é reduzida<br />
a “hibridismo”, “identidade móvel”, “incluído-excluído”,<br />
traços culturais desprovidos de<br />
arkhé e eidos.<br />
Há que se ter cuidado! De onde provêm<br />
essas análises? De que lugar se está falando?<br />
Qual a origem da bacia semântica que imprime<br />
esse repertório equivocado? Será que todos os<br />
povos do planeta têm as suas existências submetidas<br />
a essas “metamorfoses” típicas do jei-<br />
1<br />
Somos integrantes da Aliança por um Mundo Responsável,<br />
Plural e Solidário com sede em Paris, que vem mobilizando<br />
intelectuais, lideranças e artistas de todo o mundo.<br />
Atualmente, estamos envolvida na organização do<br />
Fórum Mundial Diversidades Culturais no século XXI,<br />
Patrimônio e Criatividade, iniciativa da Sociedade de Estudos<br />
das Culturas e da Cultura Negra no Brasil –<br />
SECNEB, UNESCO, Secretaria da Cultura do Estado da<br />
Bahia e Prefeitura Municipal de Salvador. O Fórum será<br />
realizado na Bahia em 2004, reunindo personalidades de<br />
vários países.<br />
2<br />
Categoria elaborada por Muniz Sodré tendo como referência<br />
o sistema midiático de comunicação.<br />
62 Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 61-80, jan./jun., 2003