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Edição Nº 19 - Uneb

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Do monopólio da fala sobre educação à poesia mítica africano-brasileira<br />

... a plasticidade das imagens, as analogias, as<br />

alegorias, os diálogos dramatizáveis, a maneira<br />

negra de falar, o português dos velhos africanos<br />

que procuram adaptar e ilustrar, no plano do texto,<br />

o complexo contexto simbólico nagô. (...) Em<br />

sua genuinidade, os contos são formas específicas<br />

de transmissão dos valores sociais, místicos<br />

e éticos da tradição nagô, dos mais velhos aos<br />

mais jovens. (LUZ, <strong>19</strong>77, p.20.)<br />

O acervo literário do patrimônio civilizatório<br />

africano está caracterizado pelos contos que,<br />

geralmente, estão relacionados ao sistema oracular.<br />

A originalidade dos contos expressa formas<br />

específicas de transmissão dos valores da<br />

tradição, constituindo um aspecto pedagógico<br />

cujo desenvolvimento ocorre numa situação do<br />

aqui e agora, referida a uma experiência vivida,<br />

capaz de gerar uma sabedoria acumulada. Aqui,<br />

a comunicação se processa de maneira direta,<br />

pessoal ou intergrupal, dinâmica, acompanhada<br />

por cânticos, danças e dramatizações.<br />

Mestre Didi Axipá é um dos principais responsáveis<br />

pela preservação e divulgação de um<br />

riquíssimo acervo de contos milenares, em que<br />

as narrativas que ele imprime caracterizam-se<br />

por afirmações pedagógicas socializadoras. São<br />

narrativas orais, apreendidas sobretudo através<br />

da iniciação ritualística, e que dão formas singulares<br />

à pedagogia africana, possuindo importante<br />

finalidade e função, porque, além de expressarem<br />

a arte, constituem o significado das<br />

diversas relações do homem com seu contexto<br />

técnico e estético. O que diferencia os textos<br />

narrados por Mestre Didi da literatura ocidental<br />

do monopólio da fala é que, nos contos, estão<br />

contidos os vários modos utilizados pelo povo<br />

Nagô para promover a adaptação e socialização<br />

dos seus integrantes, a coesão social (LUZ,<br />

<strong>19</strong>93, p.157). Assim:<br />

... os contos ilustram o acervo de textos míticos<br />

acontecimentos históricos (inclusive os ocorridos<br />

na órbita da sociedade global com seus integrantes),<br />

que marcados por sua intemporalidade<br />

narrativa e sua característica fantástica de<br />

representações, reforçam e ensinam os padrões<br />

e valores indicativos dos comportamentos necessários<br />

à coesão do grupo. Os contos narrados<br />

ilustram o significado de conhecimentos e<br />

de moral das diversas representações simbólicas<br />

que ensinam i dirigem a socialização. O significado<br />

das narrativas de Mestre Didi é<br />

patrimônio genuíno da cultura negro-brasileira.<br />

O escritor apresenta-se como narrador, como<br />

porta-voz da comunidade na comunicação com<br />

a sociedade global. (LUZ, <strong>19</strong>77, p.66).<br />

Como estamos imersos na linguagem plena<br />

em Odara, indicando outros valores para uma<br />

educação que acolha as diversidades culturais,<br />

vamos explorar uma das abordagens mais significativas<br />

da episteme africana – os contos<br />

míticos.<br />

Mais uma vez apelaremos para o acervo literário<br />

de Mestre Didi que nos conta o mito A Chuva<br />

de Poderes, numa rica adaptação feita com exclusividade<br />

para a Mini Comunidade de Oba Biyi,<br />

experiência de vanguarda no campo diversidade<br />

cultural e educação, assim reconhecida por ter<br />

inaugurado um denso repertório pedagógico<br />

alicerçado na episteme africano-brasileira.<br />

CHUVA DE PODERES<br />

Desenho feito por Maurício<br />

do Patrocínio Luz – 12 anos.<br />

por Mestre Didi<br />

Há muitos anos passados quando a Terra foi criada,<br />

as primeiras pessoas que vieram se estabeleceram em forma<br />

de uma pequena aldeia que depois cresceu e se tornou<br />

uma cidade chamada Ifé.<br />

Muitos dos Orixá que vieram do Orun, o infinito, foram<br />

morar junto com pessoas em Ifé. Quando os Orixá estavam<br />

saindo do Orun, Olorum, Senhor do Orun, que é o<br />

chefe de todos os Orixá, o mais antigo, o que comanda<br />

74 Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 61-80, jan./jun., 2003

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