Edição Nº 19 - Uneb
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Nilce da Silva<br />
Ainda para este autor, as dificuldades da<br />
aprendizagem destas crianças americanas provêm<br />
de conflitos políticos e culturais dentro da<br />
sala de aula. Tal conclusão contraria uma série<br />
de pesquisas realizadas em escolas de guetos<br />
americanos nos Estados Unidos, financiadas<br />
pelo governo deste país, pois estas afirmam que<br />
a deficiência destes alunos é a principal causa<br />
do fracasso escolar. Ou seja, a privação cultural<br />
em casa, a falta de estimulação verbal no<br />
ambiente familiar, e ainda, a inferioridade genética<br />
destas crianças, não facilitariam o aprendizado<br />
da leitura e da escrita das mesmas. Tal<br />
teoria, também conhecida como a da “privação<br />
cultural”, tem produzido um mito que na verdade<br />
é o grande obstáculo da aprendizagem.<br />
Na tentativa de destruir o mito da privação<br />
cultural, o estudioso nos mostra claramente que<br />
a fala destas crianças é rejeitada pela escola já<br />
que o sistema social americano é o de castas,<br />
fundamentado na cor das pessoas.<br />
A pesquisa de Labov (<strong>19</strong>93) ainda nos apresenta<br />
dados referentes à produção lingüística<br />
das crianças negras americanas quando as<br />
mesmas não se sentem ameaçadas. Nestas situações,<br />
elas não falam por gestos, as suas frases<br />
são ligadas entre em si, ou seja, a fluência<br />
verbal se manifesta.<br />
Crítico, como Bourdieu, das análises puramente<br />
lingüísticas, ele questiona: Por que não<br />
se escreve em VNA? Apenas, porque o inglês<br />
padrão tem convenções sociais mais estáveis,<br />
tornando-se a melhor forma de comunicação<br />
escrita. Nem por isso, acrescenta Labov, podese<br />
depreciar o VNA e seus falantes, considerando-os<br />
como portadores de deficiências no<br />
raciocínio lógico, pois este dialeto possui sua<br />
lógica, podendo o lingüista demonstrar este fato.<br />
Ou seja, há de se entender que existem meios<br />
diferentes para se expressar as mesmas coisas.<br />
Retornemos à nossa pesquisa. Os sujeitos do<br />
nosso trabalho, migrantes, na sua maioria, da região<br />
do nordeste em situação de pouca escolarização,<br />
possuem um falar particularmente diferente<br />
do falar paulistano. Neste sentido, nós estivemos<br />
atentos ao como se dá a interação verbal<br />
destas pessoas dentro da sociedade paulistana<br />
tipicamente letrada.<br />
Mais especificamente, quando pensamos nos<br />
falares lusófonos, recorremos à obra da professora<br />
brasileira Ana Maria Cortez Gomes,<br />
docente de Língua Portuguesa, na Universidade<br />
de Paris 13, tese de doutorado intitulada:<br />
Structure Propositionelle et ordre des mots en<br />
Portugais Brésilien et en Portugais Européen”.<br />
Neste trabalho, Cortez Gomes (<strong>19</strong>96) apresenta<br />
uma série de traços lingüísticos diferentes<br />
entre o português de Portugal e do Brasil.<br />
Preferimos, ao invés de relatarmos aqui estas<br />
diversificações, construir uma série de categorias,<br />
que somadas às categorias de Labov, são<br />
úteis para a análise de discurso dos nossos sujeitos<br />
em termos, apenas, da fonologia e do vocabulário<br />
1 . A saber:<br />
Em termos de fonologia:<br />
1. A produção do /di/.<br />
2. A produção do /ti/.<br />
3. A produção do /uma/.<br />
4. A produção do /us/.<br />
5. A produção do /r/: no meio das palavras e<br />
no final delas.<br />
6. A produção dos grupos /lh/ e /nh/.<br />
7. A entonação das frases 2 .<br />
8. A entonação das palavras.<br />
9. A velocidade nas seqüências lingüísticas.<br />
10.Acréscimo ou diminuição de vogais na pronúncia.<br />
11. Acréscimo ou diminuição de consoantes.<br />
12.Diferenciação na pronúncia de consoantes.<br />
Marcos Bagno (<strong>19</strong>99) alerta-nos para a existência<br />
do preconceito lingüístico em nosso país,<br />
e nós acrescentamos: nas salas de aula de ensino<br />
supletivo também. Há diversos “fenômenos<br />
“ lingüísticos que ajudam a entender o preconceito.<br />
A saber:<br />
1) O fenômeno lingüístico conhecido na literatura<br />
especializada como ROTACISMO, presente<br />
na fala de muitos de nossos sujeitos ao<br />
1<br />
A tese de Ana Maria Cortez, citada na bibliografia final<br />
deste trabalho, traz também elementos importantes sobre<br />
as diferenças dialetais da língua portuguesa em termos<br />
da sua gramática.<br />
2<br />
Não conseguimos registrar a entonação das falas dos<br />
nossos entrevistados que possivelmente variariam, já que<br />
têm diversas naturalidades.<br />
Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 173-180, jan./jun., 2003<br />
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