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Edição Nº 19 - Uneb

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Yara Dulce B. de Ataíde; Edmilson de Sena Morais<br />

vador. Esta instituição, dentre outras propostas,<br />

além da assistência médica social, promove<br />

ações educativas com o objetivo de estimular o<br />

desenvolvimento da consciência ecológica, o<br />

exercício da cidadania e a elevação da autoestima,<br />

convergindo essas atividades no sentido<br />

de resgatar a identidade local, social, étnica,<br />

histórica e cultural da comunidade de entorno.<br />

Esse Centro instituiu o Curso de Corte e<br />

Costura Étnica, numa perspectiva sócio-político-cultural<br />

que faz parte de um desdobramento<br />

mais amplo do seu projeto político-social. Sua<br />

perspectiva é viabilizar a inclusão social de sujeitos<br />

de uma área que sofre problemas estruturais<br />

de habitação, moradia, assistência médico-sanitária<br />

e outros, presentes nos bairros periféricos<br />

das grandes metrópoles. Nesse contexto,<br />

foi percebida a necessidade de possibilitar<br />

a esses sujeitos, de maioria afro-descendente,<br />

uma reflexão a respeito da sua identidade<br />

étnico-cultural, no sentido de contribuir para a<br />

construção do referencial próprio desses sujeitos<br />

étnico-sociais enquanto cidadãos da periferia<br />

de Salvador.<br />

Antonio Risério (<strong>19</strong>88) considera Salvador<br />

uma cidade luso-banto-jeje-nagô pela sua configuração<br />

matricial étnica africana presente no<br />

cotidiano, nas falas, nos gestos, nos rituais, no<br />

colorido dos trajes e nas gentes que formam<br />

seu povo. Por isso, Salvador é considerada a<br />

segunda maior cidade de contingente negro,<br />

depois da Nigéria. Entretanto, percebemos que<br />

Risério eliminou o aborígine dessa configuração,<br />

apesar do elemento índio ter sido completamente<br />

dizimado em áreas das grandes metrópoles<br />

coloniais. Mesmo assim, Darcy Ribeiro,<br />

em seu livro O Povo Brasileiro considera<br />

que o útero brasileiro foi indígena.<br />

Segundo Ribeiro (<strong>19</strong>95), os primeiros contingentes<br />

africanos trazidos como escravos para a<br />

Bahia e outras áreas, posteriormente inseridas<br />

na primeira economia colonial – que foi a cultura<br />

da cana-de-açúcar – foram masculinos, e existem<br />

evidências de que muitos colonizadores usaram<br />

as índias escravizadas, resgatadas dos massacres,<br />

para a reprodução do braço escravo.<br />

Darcy Ribeiro (<strong>19</strong>95), referindo-se à etnia<br />

brasileira, considera o mameluco como o verdadeiro<br />

brasileiro. Na sua concepção, o africano<br />

entra em segunda instância, não negando,<br />

contudo, sua grande contribuição étnico-cultural<br />

na formação do povo brasileiro. Outrossim,<br />

vale reforçar que o processo de miscigenação<br />

foi compulsório em alguns momentos, mas foi<br />

espontâneo em outros, como a presença de indígenas<br />

nos quilombos de Palmares e, conseqüentemente,<br />

em muitos dos milhares de quilombos<br />

que se formaram ao longo da luta contra<br />

a escravidão. Em contrapartida, havia africanos<br />

convivendo em aldeias indígenas. Podemos<br />

chamar esse fenômeno de a “solidariedade<br />

coexistência dos oprimidos”.<br />

Não podemos perder de vista que a presença<br />

indígena não permanece apenas nos elementos<br />

da nossa cultura material, mas a expectativa<br />

de vida desses povos propiciaram a sobrevivência<br />

de outros tantos que aqui chegaram, africanos<br />

e europeus. Como “donos da terra”, passaram<br />

seus conhecimentos tecnológicos e medicinais,<br />

táticas de sobrevivência nas matas tropicais<br />

e um modo de viver próprio que foi assimilado<br />

pelos estrangeiros. Além disso, trazemos<br />

em nossos traços fisionômicos a herança genética<br />

do nativo ancestral.<br />

Por conta disso, a expressão de Risério lusobantu-jêje-nago<br />

deveria conter, também, uma<br />

referencia ao aborígine, também nosso ancestral,<br />

que as comunidades de terreiro reverenciam<br />

chamando-o “caboclo”. Dessa maneira,<br />

propomos incluir na sua denominação um outro<br />

elemento, o tupi. Na realidade, somos um povo<br />

luso-tupi-bantu-jêje-nagô, pluralizado continuamente<br />

pelas mais diversas culturas que migraram<br />

para o nosso país, ao longo da nossa<br />

história, e continuam cada vez mais migrando e<br />

reformulando valores ético-estéticos e sociais.<br />

2. Identidade: processo histórico<br />

das interações sociais<br />

A contemporaneidade se caracteriza como<br />

uma fase de acirramento das contradições sociais<br />

e de confrontos étnico-culturais. Esses<br />

fenômenos desnudaram a face oculta e espúria<br />

da hegemonia eurocentrista e obrigaram todos<br />

a reverem privilégios, conceitos e preconceitos<br />

Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 81-98, jan./jun., 2003<br />

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