Edição Nº 19 - Uneb
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José Eduardo Ferreira Santos<br />
cas importantes da formação humana, particularmente<br />
aquelas ligadas à cultura e à arte, que<br />
efetivam aquilo que o Estatuto da Criança e do<br />
Adolescente chama de Proteção Integral. Um<br />
exemplo dessa sensibilidade dos projetos sociais<br />
é a proposição da cultura africana e da cultura<br />
popular brasileira como instrumentos de inserção<br />
educativa, através de valores culturais ancestrais<br />
africanos, como a capoeira, o maculelê<br />
e outras manifestações. A escola tem tentado<br />
fazer o mesmo, só que sem o devido sucesso<br />
por reduzir a cultura a conteúdos programáticos,<br />
sem vida.<br />
Os projetos sociais, por sua vez, se caracterizam<br />
pela diversidade de propostas educativas,<br />
geralmente com o escopo de promover a cidadania<br />
através da arte, da cultura e da profissionalização.<br />
Deste modo, conseguem promover<br />
uma proposta pedagógica que tem muito a ensinar<br />
à escola, pois através dessa didática voltada<br />
ao lúdico e às necessidades das crianças e<br />
adolescentes, conseguem o estabelecimento de<br />
vínculos e aprendizagens para a vida. Por fim,<br />
os projetos sociais conseguem favorecer a aprendizagem<br />
e o encontro das crianças e adolescentes<br />
com uma diversidade cultural que muitas<br />
vezes a escola não abarca. A existência<br />
destes espaços educativos favorece, também,<br />
a criação e manutenção de espaços de segurança,<br />
apoio e estabilidade, promovendo o encontro<br />
com referenciais diferentes daqueles da<br />
marginalidade e da violência.<br />
AS CRIANÇAS E OS ADOLESCENTES<br />
As crianças e os adolescentes com os quais<br />
trabalhei em Novos Alagados são iguais a quaisquer<br />
outras do mundo inteiro. Têm as mesmas<br />
exigências, necessidades, o mesmo coração, a<br />
mesma humanidade. Porém, há peculiaridades<br />
pessoais e do contexto, marcadas pela história<br />
individual e do local onde habitam. Eles são o<br />
resultado de um continuum civilizatório que<br />
muitas vezes é marcado pela exclusão e pelo<br />
enfraquecimento das redes sociais.<br />
A falta de melhores condições de alimentação,<br />
moradia, saúde e educação são algumas<br />
características dessa exclusão. As crianças e<br />
os adolescentes de Novos Alagados poderiam<br />
ser caracterizados como aqueles em situação<br />
de risco psicossocial e vulnerabilidade, frente<br />
às situações adversas do contexto social no qual<br />
se encontram, desde a violência até o contexto<br />
próprio da pobreza urbana, na sua face mais<br />
grave, a miséria, o uso de drogas, o trabalho<br />
informal e a exploração e a vitimização sexual.<br />
A miséria pode ser entendida como a impossibilidade<br />
de mudança, enquanto o fracasso<br />
é o aparelho que reforça a idéia de que o homem<br />
é formado de acordo com o lugar onde<br />
está inserido. Daí surgem pensamentos determinantes<br />
e fatalistas do tipo “se favelado, logo<br />
incapaz, marginal, fracassado, que não<br />
aprende”, e outros adjetivos mais desoladores.<br />
Para uma mudança dessa ideologia o educador<br />
deve partir do pressuposto de que todas as crianças<br />
são capazes, ultrapassando essa visão que<br />
é introduzida pela realidade social cada vez mais<br />
excludente. Todas podem aprender, ou seja,<br />
nenhuma criança é destituída das capacidades<br />
de aprender e de se desenvolver, sendo esta a<br />
característica principal das crianças e adolescentes<br />
enquanto pessoas em desenvolvimento.<br />
Aqui a interação, tão sobejamente discutida,<br />
transforma-se em realidade. É fato inconteste<br />
que as crianças aprendem construindo;<br />
porém, é bom lembrar, a construção das interações<br />
com o mundo não podem dar-se<br />
aleatoreamente àqueles que estão por perto. As<br />
crianças necessitam saber-se indivíduos, sujeitos<br />
de direito. Cada nome, cada recomendação<br />
dos pais, todo cuidado com o trato é pouco;<br />
enfim, deve-se entender que ensinar não é transmitir<br />
conteúdos, mas, antes de tudo, ser responsável<br />
por essas pessoas cuja educação nos<br />
foi confiada, para que essa educação não seja<br />
um ideal figurativo e abstrato, mas uma realidade<br />
presente que transforma educadores em<br />
responsáveis pelos alunos e por suas vidas.<br />
Suas características psicossociais revelam<br />
uma experiência inicial com situações de violência,<br />
na família e no bairro, assim como a exposição<br />
a fatores de risco, dentre eles o extermínio<br />
(morte) e outras vitimizações. Ao educador<br />
cabe estabelecer vínculos positivos com os<br />
Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 113-133, jan./jun., 2003<br />
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