Edição Nº 19 - Uneb
Edição Nº 19 - Uneb
Edição Nº 19 - Uneb
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Léa Austrelina Ferreira Santos<br />
de origem européia. São valores europeus que,<br />
justa ou injustamente, se impuseram no Brasil ...<br />
(SCHWARTSMAN, 2003, p. 01 - grifos meus)<br />
O pensamento do jornalista, além de equivocado<br />
sobre o que dispõe a Lei, é um pensamento<br />
unívoco. A luta de diversas entidades,<br />
estudiosos e comunidades afro-descendentes é<br />
a de afirmar a diversidade cultural presente em<br />
nossa sociedade. Ao contrário do que ele diz, a<br />
população de origem africana no Brasil não se<br />
constitui em uma minoria: este é um dos maiores<br />
segmentos populacionais do Brasil. Além<br />
disso, não se propõe fazer uma historiografia<br />
dos afro-descendentes em detrimento da história<br />
dos outros povos presentes no País. O que<br />
se propõe é o reconhecimento da diversidade<br />
cultural no Brasil e o ensino da história dos afrodescendentes<br />
pode reforçar esse propósito.<br />
A Lei 10.639/03 pode contribuir para o amadurecimento<br />
da luta da população afro-descendente<br />
no Brasil, com as políticas de ação afirmativa,<br />
para redução das desigualdades. Mas<br />
o aspecto que consideramos mais importante<br />
fica, muitas vezes, esvaziado no contexto dessa<br />
luta, que é a dimensão da afirmação da diversidade<br />
cultural – algo que transcende as<br />
delimitações de “raça” e “cor” –, dizendo respeito<br />
à afirmação existencial da população afrodescendente.<br />
As políticas de ação afirmativa são um tema<br />
muito polêmico e têm gerado diversas discussões<br />
necessárias e urgentes, mas não é minha<br />
intenção discuti-las aqui. A intenção é buscar<br />
uma compreensão sobre a Lei referida, analisar<br />
a sua importância no contexto do Estado da<br />
Bahia, cuja população é, em sua maioria, de<br />
origem africana, e perceber, através de uma<br />
perspectiva já delineada, a do Projeto Odemodé<br />
Egbé Asipá – Juventude da Sociedade Asipá,<br />
a concretização de ações educativas pluriculturais<br />
a partir da referência ancestral africanobrasileira<br />
e que diz respeito à afirmação existencial<br />
da população de origem africana .<br />
Há um aspecto fundamental trazido por essa<br />
Lei. Trata-se da possibilidade de se oferecer<br />
aos jovens brasileiros uma visão distinta da história<br />
dos povos de origem africana, de enfrentar<br />
o silêncio da historiografia oficial e da escola<br />
em relação ao processo civilizatório africano-brasileiro.<br />
Não é novidade que a historiografia<br />
oficial reduz a presença africana e omite as<br />
personalidades que lutaram e lutam para afirmação<br />
desta cultura no Brasil.<br />
São, entretanto, possibilidades, pois a mera<br />
sanção da Lei não assegura que esses conteúdos<br />
serão tratados de forma realmente positiva<br />
para a população afro-descendente, ou seja, que<br />
os jovens possam admirar e reconhecer as suas<br />
origens e possam ter uma auto-imagem positiva<br />
ou que as manifestações culturais de origem<br />
africana deixarão de ser tratadas como folclore<br />
pela escola ou, ainda, e a pedagogia do recalque<br />
às identidades deixará de existir. A Lei em<br />
questão é uma possibilidade de enfrentamento<br />
desses problemas.<br />
Esse aspecto é ressaltado porque foi a partir<br />
da necessidade de afirmação da identidade sócio-cultural<br />
dos afro-descendentes que o Projeto<br />
Odemodé Egbé Asipá foi estruturado. O ensino<br />
da cultura e da história dos afro-descendentes<br />
precisa estar ancorado numa perspectiva fundada<br />
na afirmação da nossa diversidade cultural.<br />
No sentido de enfrentamento da realidade<br />
imposta à população de origem africana e<br />
aborígine no Brasil e especialmente na Bahia,<br />
destacamos algumas iniciativas vinculadas ao<br />
PRODESE - Programa Descolonização e Educação,<br />
do Departamento de Educação, Campus<br />
I da UNEB - Universidade do Estado da Bahia.<br />
O PRODESE fomenta atividades em pesquisa,<br />
ensino e extensão que visam a afirmação<br />
da nossa pluralidade cultural, e apóia e estimula<br />
o desenvolvimento de ações educativas e elaborações<br />
teóricas voltadas para esse sentido.<br />
O Programa Descolonização e Educação –<br />
PRODESE desenvolve produções acadêmicocientíficas<br />
no contexto da diversidade étnicocultural<br />
das Américas. Essas produções vêm fomentando<br />
pesquisas, estudos e atividades de<br />
ensino e extensão, baseados numa ética que<br />
permita a garantia da coexistência e expressão<br />
territorial dos continuuns civilizatórios que caracterizam<br />
este continente.<br />
Agrega estudiosos e pesquisadores que produzem<br />
participações criativas, com vistas a superar<br />
os paradigmas neocoloniais e etnocêntricos<br />
que estruturam a política de educação no Brasil,<br />
Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 12, n. <strong>19</strong>, p. 99-111, jan./jun., 2003<br />
103